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O PS2 DESBLOQUEADO que toca funk, estuda jazz no Japão e xinga Mark Zuckerberg

O PS2 DESBLOQUEADO que toca funk, estuda jazz no Japão e xinga Mark Zuckerberg

E, no dia 20 de março, se apresenta ao vivo em Tóquio

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ps2desbloqueado guilherme dj produtor

Segundo o livro de eventos mundiais, em outubro de 2024, as forças armadas de Israel invadiam o Líbano pela sexta vez na história —antes, 800 libaneses foram mortos após um ataque aéreo; Alexandre de Moraes autorizava o desbloqueio do X no Brasil; o ex-presidente da Bolívia, Evo Morales, sofria uma tentativa de assassinato; um PS2DESBLOQUEADO começava a ser reconhecido como produtor de significado —e funk— nos anais da internet.

À Billboard Brasil, o perfil criado pelo fluminense Guilherme (“pode deixar sem o sobrenome, quero ver até onde consigo manter assim”) contou um pouco de como um Playstation 2 desbloqueado comprado pela mãe foi um portal que, em 2024, o levaria com prestígio para a música eletrônica underground brasileira. É com o nome artístico que ele também assina “VOLTRUN 2049”, presenta na coletânea “VOLT MIX: O Retorno (LADO B – ILEGAL)“, da Speedtest.

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Não mais que de repente, então, o Twitter e páginas como o Rate Your Music começaram a ebulir o nome deste DJ/produtor como novidade e, mais do que isso, reconhecer mais um moleque que, fruto do universo videogameniano, passava a fazer loucurar com samples e beats de funk nas camadas menos superficiais da rede mundial.  “Quando descobri a cena de Soundcloud (Nação Rebolation 69, Humildes do Som Coletivo [ex-Humildes do Soundcloud], Speedtest), minha cabeça explodiu e comecei a produzir”, diz o dono do pseudônimo que remete à categoria de videogames da Sony que, hackeados, sofrem modificações corporais como chips instalados em suas entranhas que permitem aos usuários, entre outra coisas, rodarem milhares de jogos piratas por meio de pen drives.

A empreitada está deixando Guilherme rico. No dia 18 de março, só da plataforma Bandcamp, ele recebeu incríveis 74 centavos de dólar. O tuíte que revela isso também expõe como tudo ainda é muito recente para o cientista da computação que foi para o Japão estudar programação visual e jazz.

Metaleiro aos 14 no interior do Rio, electrofunk no Japão aos 26

“O nome [PS2DESBLOQUEADO] é por memória afetiva. Minha mãe trabalhou um bocado e nos primeiros governos Lula conseguiu parcelar um Playstation 2 em mil vezes pra deixar o filho feliz”, conta o rebento da dona Cristina, nascido em Casimiro de Abreu, município do interior do Rio de Janeiro buscado por turistas atrás de praias, pôr do sol na ponte quebrada e um lugar sossegado mas não tão longe assim da capital. Hoje, ele mora em Inagi, cidade localizada na zona oeste de Tóquio.

O caso de Guilherme não é isolado. “Tem essa brincadeira de nomes de DJ engraçados no Twitter e no Soundcloud. Eu só aderi a brincadeira com algo que me representava, ao mesmo tempo que fosse engraçado e descontraído para esse projeto secundário”, explica. A comunidade brasileira no Soundcloud vai desde o “DESTRUIDOR DO FUNK” passa por produtores renomadíssimos no electro como o “ICQ BABY”, de Agazero, e culmina em experiências que flertam com o mainstream como o DJ Tonias —pseudônimo de Maffalda, notável produtor do pop brasileiro ou mesmo no ainda inclassificável DJ QUERO SER PADRASTO.

Produzindo enquanto lutava para se formar na escola de música, o tal do PS2 DESBLOQUEADO foi criando pérolas. Já com perfis criados no Twitter e no Instagram, o produtor estava indo de faixas como “MTG TENHO TRABALHO FINAL PRA AMANHÃ E AINDA NÃO COMECEI [[ PIQUEZIN REPROVAÇÃO ]]” para “新時代 NO SÉRIE GOLD X MEU AMIGO TOTORO (DJ PS2 DESBLOQUEADO) [[ VAI TOMA NO CU UNIVERSAL MUSIC🖕 ]]”.

“Eu produzo desde o 14 anos. Gravava metal com meus amigos da região e fizemos uma banda que rendeu contrato com selo independente na Alemanha”, diz referindo-se à banda Dead Limbs que chegou a lançar um EP e um álbum pela Northern Silence Productions. “E, aí, só continuei estudando produção. Comecei a fazer trap de brincadeira, fui pro funk para fazer memes de black metal com funk, até que me apaixonei pelo funk (em paralelo ouvia muito samba e bossa nova)”, rememora. “Eventualmente, a fase ‘rock wins’ passou e eu consegui perceber a grandiosidade do funk. Deixou de ser ironia para admiração —e de como, a cada ano, o gênero se renova”.

A entrevista, portanto, acompanha um produtor com essas características: metaleiro na adolescência e que, agora, se apresenta em Tóquio, no dia 20 de março, ao lado de VHOOR e de emergentes do electro-funk no Japão como o brasileiro AXELERATOR e a japonesa バイレファンキかけ子/BAILEFUNK KAKEKO —inclusive, foi a DJ japonesa quem, em busca de alguém que tocasse funk nas redondezas, encontrou o DJ como uma possibilidade de abertura para esse primeiro momento de baile para PS2DESBLOQUEADO. Até pouquissímo tempo atrás, Guilherme não detinha nem uma controladora —o videogame dos DJs.

“Na verdade, nem sei até onde isso vai. Sempre trabalhei part-time com engenharia de software para me manter. Precisava ajudar minha família também. Esse evento com o Vhoor é minha primeira vez recebendo pra tocar”, diz. O cachê também vai recompensar os produtores independentes que cederam faixas para a apresentação. “Ainda estou tentando entender se realmente consigo viver disso. Por enquanto é um hobbie —que me rouba muitas horas”.

Jazz, Mark Zuckerberg, Luigi Mangione e o drum and bass feito no joystick

Agora, em 2025, DJ PS2 DESBLOQUEADO emplacou uma faixa de nome escalafobético “VAI TOMA NO CU MARCOS ZUCKEBERG 🖕 – TROPA DO XANDÃO – MC LUIGI MANGIONE DA NOVA HOLANDA ( DJ PS2 DESBLOQUEADO ) [[ PIQUEZIN ÓDIO DE CLASSE]]” —um dos melhores lançamentos do ano e com todos os ingredientes de meta descrição pertinentes às mentes que produzem funk no Soundcloud.

A coletânea do produtor foi ganhando corpo enquanto conduzia sua formação na Tokyo Visual Arts e, depois, na Senzoku Gakuen College of Music. “É um curso que chama 音楽音響デザイン, na área de Composição e Arranjo (estudo jazz principalmente). Não sei como traduzir especificamente, mas é algo como Sound Creation, em inglês”, explica. O curso inspirou a faixa “MTG TENHO TRABALHO FINAL…” citada nos primeiros parágrafos mas também a criação de um protótipo no qual o produtor conduziu uma faixa de drum and bass tocada em um joystick de videogame (você pode conferir o projeto da parafernália aqui).
“Gostar de videogames moldou minha personalidade toda. Comecei no PS2, depois passei anos jogando no computador —que minha mãe também suou para me dar. Foi onde aprendi a programar e o que me levou a estudar Ciência da Computação na Universidade Federal Fluminense de Rio das Ostras, antes de eu largar pra estudar musica aqui.  Por causa disso tudo eu virei um nerdzão de internet”, descreve o filho da Cristina, mas também do humor propagado por comunidades como South America Memes que, por volta de 2008, estavam designando novas linguagens nas camadas mais internas da web —e que depois viriam a explodir até nos camelôs, como foi o caso do “meme das carinhas”.
“Isso me alienou um pouco de pessoas ao meu redor mas, ao mesmo tempo, moldou o meu senso estético que se reflete nas samples que eu escolho usar, nos artistas que eu escolho remixar”, emenda.

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