Léo Santana sobre racismo: ‘Estou cagando, vão ter de me engolir’
'Preto e pagodeiro', cantor quer criar a filha para não levar desaforo para casa
Capa da edição #5 da Billboard Brasil, Léo Santana é pai de Liz, 2 anos, com a mulher, a dançarina Lore Improta, e diz que a paternidade mudou sua vida. “Desde que eu era muito novo eu dizia que queria ser pai. Sem ter base nem entendimento do que isso de fato significaria. E aí, quando aconteceu, meu Deus do céu…”
Ele conta que estava passando por uma fase de muito sofrimento, pois era pandemia e havia acabado de perder o pai, por um infarto fulminante. “Sou o pilar da família há alguns anos, então tinha que me mostrar forte por minha mãe e minhas irmãs. Não podia me entregar ao que realmente estava sentindo, que era uma tristeza imensa. Creio que fiquei um pouco depressivo, sim, mesmo que na época não tenha percebido. Fiquei na bad e ainda por cima não podia trabalhar. Tudo aquilo mexeu muito comigo.”
Assim que o isolamento social afrouxou, Léo começou a ir para a academia, para “espairecer, fazer algo de que gostava”. Um dia, quando voltou para casa após treinar, Lore pediu que ele participasse de um vídeo para seu canal no YouTube.
“Cheguei da academia no início da noite, estava muito triste, numa angústia, aquela sensação de não querer sair da cama, não querer ver ninguém. E ela: ‘Vamos ali gravar um negócio para o meu canal’. Eu dizia que não, que não queria, que não estava a fim. E ela insistindo. Aí eu subi. Ela me pediu para fechar os olhos e, quando abri, tinha dois sapatinhos. Aí eu desabei.”
“Você vê como Deus é incrível. Eu estava numa situação difícil mentalmente e de coração também, por causa da perda de meu pai. E Deus me supriu –não que substitua– mas me supriu com uma outra vida, de uma filha minha. Choramos para caramba. Toda vez que eu vejo esse vídeo, até hoje, me emociono.”
Ele conta que, quando Liz chegou, tornou-se ainda mais responsável. “Tenho essa preocupação por ser um pai não tão presente. Isso me incomoda. Penso direto: ‘Caramba, estou perdendo momentos da minha filha’. Mas eu amo trabalhar e é tudo em prol dela, pelo futuro e o bem-estar dela. E, quando tenho folga, aproveito ao máximo, beijo, dou dengo, assisto a desenho e converso. É uma sensação indescritível ser pai, ainda mais de uma menina como Liz, que é muito especial.”
Criando a filha com questões raciais
Lore já falou publicamente sobre a preocupação de criar a filha conectada a questões raciais que considera importantes. “Eu, como homem preto, vivi esse entendimento racial de forma natural. Meus pais nunca falaram sobre isso. Com o tempo, vou ter essa conversa com a Liz e fazer com que se orgulhe do que ela é: filha de um homem preto e de uma mãe branca. Mas quero que ela entenda de forma natural, porque existe o racismo, mas ela também pode sofrer, por exemplo, por ser mulher. Existem várias questões importantes. Mas sei que Liz vai ser muito astuta. Ela não vai voltar para casa com desaforo, de jeito nenhum.”
Léo acredita que os exemplos que a pequena tem em casa, os pais, familiares e amigos próximos, serão também decisivos em sua formação.
“É notório: quando você vive em um ambiente em que as pessoas sabem se comportar, isso influencia a criança. O nosso círculo é assim, com pessoas muito corretas, honestas e respeitosas. E cada uma tem sua vivência, Liz terá a dela. Eu sofro preconceito, mas é muito mais de olho torto.”
Preto pagodeiro. Mas eu estou cagando, porque vão ter que me engolir. Eu sou desse tipo. Vão ter que aturar a presença de um preto periférico bem-sucedido no lugar onde vocês estão. Quero que Liz seja assim também. Sem desrespeitar ninguém, simplesmente.”
Não só um corpinho bonito
Outra coisa com a qual teve que aprender a lidar nas redes sociais foram os comentários sobre sua aparência e seu corpo.
“Não me incomoda mais, não. Mas antigamente, sim. As pessoas começaram a me rotular como símbolo sexual e acabaram esquecendo que eu também estava crescendo devido às minhas canções. Eu dizia: ‘Caramba, véio, eu não sou só esse corpinho bonito, não!’. As pessoas não davam atenção ao meu trabalho, à minha arte. A ponto de chegar em entrevista e me pedirem para tirar a camisa. Mas hoje não mais, tenho 18 anos de carreira e um leque imenso de sucessos. E também, com essa minha fase de marido e pai, as pessoas têm sido mais respeitosas.”