Aposta de Matuê, Brandão lança ‘CEO’ com diss para antiga gravadora
Matuê se tornou uma espécie de mentor do cearense Brandão
Brandão surgiu algumas vezes no noticiário recente do trap. Em todas, o rapper tinha em Matuê uma espécie de mentor: primeiramente, ouviu o chamado para sair de Caponga, no Ceará, e ir rumo à Fortaleza; depois, viu-se como coprodutor de um dos álbuns mais aguardados (e escutados) do ano, “333”, do próprio Tuê. Agora, sob as asas do tutor, ele lança “CEO”, álbum puxado pela diss “Pretinho Uva”, em que explana sua antiga gravadora, que largou para assinar com a 30PRAUM, selo de… Matuê.
À Billboard Brasil, com sorriso largo e guia de Ogum, o rapper conta da mudança para Fortaleza, do processo de “333” e de como “CEO” é um marco em seus 24 anos de idade.
Billboard Brasil: É um momento inédito na sua vida? Em termos de felicidade?
Brandão: Com certeza, irmão. Sem sombra de dúvidas, são vários momentos novos. Estamos conseguindo chegar longe, compartilhando as mesmas ideias e os mesmos objetivos. É meu melhor momento e a fase mais importante da minha vida.
Imagino que seu primeiro contato com o Matuê tenha sido legal…
Nunca vou esquecer. Foi em um momento bem crítico da minha carreira, um momento bem embaçado. Eu não fazia show, não fazia música, por conta do problema com a gravadora em que eu estava [a Hash Produções]. Eu estava no Rio de Janeiro e eu lembro simplesmente do mano Tuê mandando mensagem: “E aí, irmão. E aí, mano. Estou acompanhando sua situação, cola aqui em Fortal, quero te fortalecer”. Eu escutei e vim para Fortaleza sem nenhuma pretensão de entrar para a gravadora dele. Achei que ele ia me ajudar por fora. Quando olhei, já estava no “333”, no “CEO”. Foi um contato bem “trap”. Ele me resgatou [risos].
Como você resumiria o momento anterior com a Hash?
Acho que o público tem de saber mesmo. Eu falei sobre isso na diss [Pretinho Uva] e é no som que eu trato esses assuntos mais profundos. Mas, basicamente, a gente estava com uma galera bem pouco profissional. Acabou que tudo o que íamos fazer foi “desvirtuado”, que é movimentar a cena, trabalhar com o coração. Isso gerou muito estresse.
Como assim?
A gente descobriu vários problemas, como falta de relatório e de comprometimento. Várias coisas que são básicas para manter uma relação saudável com um artista. E isso gerou o princípio da guerra e estamos aí.
Você chegou a perder o tesão de fazer música?
Em nenhum momento. Foi ela que me deixou de pé. Foi uma sensação muito estranha. Eu estava fazendo muita música e sem poder lançar nada. Ao mesmo tempo, fiquei confortado e consumido. “Meu Deus, preciso lançar!” e também “Isso aqui é o meu refúgio”. Eu só fiquei mais forte, foi essencial [fazer música].
“CEO”, então, é a narrativa dessa caminhada até aqui.
[O rapper roda o ambiente em que está, quase frenético, exibindo um sorriso ainda mais largo, orgulhoso]. É um disco celebrativo, que simboliza essa nova fase. Virada de chave, de vida. O disco sai dia 23 (quarta-feira). Eu estou muito empolgado.
Dá para ver que você está feliz.
[Ele gargalha] Mano… [gargalha novamente]. Não tem como esconder a felicidade. A gente está em momento que vê todo o trajeto acontecendo, todas as reuniões. É muito foda. [O álbum] Vai surpreender a galera, tanto nos beats, quanto nas letras, nos flows. É meu objetivo na música: deixar minha face na música, minhas ideias, meu gosto musical. Tipo assim, nitidamente é um som bem mais lapidado, mais aprimorado. É um disco do meu momento.Esse diferencial seu se dá de que forma? Qual é o seu DNA de produtor, considerando que você foi co-produtor de “333”?
Irmão, então, eu sempre busco as paradas bem peculiares, diferentes. Aquele molho do trap que a galera ouve e se identifica, mas, ao mesmo tempo… Por exemplo, “Honey Babe” [faixa do EP “Sabor Overdose no Yakisoba”, antecessor de “333”], eu vi as pessoas falando “você ouve o beat e sabe que foi o Brandão que fez”. Essa mistura de timbres, de sons, de gêneros e transformar tudo isso em trap… Eu diria que esse é meu DNA. Não é nada clichê.
É curioso porque o trap, como qualquer gênero massivo, acaba tendo uma homogeneidade e é curioso ver como parece que vocês estão tentando esticar a corda.
O mercado acaba exigindo isso de alguns artistas. Eu não fecho com essa ideia, eu sou fechado com a arte. Em toda minha carreira eu sempre busquei esse caminho contra esses rótulos. De querer mostrar a minha arte, minhas ideias, meu som. E influenciar as vidas das pessoas por meio disso.
O que você tem ouvido de diferente?
Eu escuto muita parada louca. Ultimamente eu tenho escutado muito o “Vultures”, do Kanye [West]. “Timeless” [de The Weeknd e Playboy Carti] que é um som bem diferente, atmosférico. É… Tem um álbum muito bom também que é “Die Lit”, um álbum antigo [de 2018, também de Playboy Carti], mas que é bem peculiar. O nome do disco já passa uma visão muito trap, autêntica: “morrendo aceso”, “morrendo pra cima”, na maior “wave” possível. Também tenho ouvido muito reggae para deixar em um feeling mais chill.
Você chegou a tratar com o Matuê sobre a disciplina nesse processo de pré-gravação? Ele catequizou vocês a entrarem no método “Tuê”?
Sim. Aqui na 30PRAUM a gente tem muito essa parada de saber o que está fazendo, o que está passando. Ele trocou uma ideia com a gente sobre estar travado e que estava empolgado para criar junto no estúdio. Eu disse “conta comigo”. A cada criação de som a gente já tinha uma ideia, ele já vinha com algumas visões… O processo foi muito destravado. Eu vejo como um momento de desbloqueio de ideias. Tudo fluiu muito simples, rápido. Claro que levou um tempo para reproduzirmos tudo. E o Tuê falou “eu estou feliz porque fazia tempo que eu não me divertia no estúdio”. Eu fico muito feliz de ter feito parte desse momento, de ter criado esse sentimento.
Até pouco tempo atrás você estava vivendo um momento em que não sabia como ia gravar suas músicas e, de repente, está com um dos maiores MCs do gênero…
Meu irmão… Vou te falar… [faz uma pausa longa na fala]. Isso é a maneira correta de um “CEO” voltar para o game. Se é para fazer de uma forma gangsta, então vamos fazer de uma forma gangsta. “CEO” é fruto de muito trabalho da gente. Foi uma virada de chave. Por vários momentos eu fico pensando: “Caralho… Olha onde nóis está”. Eu simplesmente não sabia onde ia parar com minha carreira.
O nome “CEO” remete, obviamente, ao lance empresarial. Mas você é um cara que lida com espiritualidade? Isso no seu pescoço é um cordão ou uma guia?
Sim, mano. Tem sido fundamental. Tenho buscado muito cuidar desse lado. Eu sou da umbanda, tá ligado? Tenho meus guias, meu orixá, minha entidade que me protege e me rege… Me dá sabedoria e criatividade para criar coisas novas… Eu sou filho de Ogum [mostra a guia]. Isso é algo que está bem fundamentado em minha vida.
Quem ouvir o álbum consegue captar esse lado também?
Consegue. Na última faixa do álbum, que se chama “Melhor Fase”, eu abordo esse tema. Eu falo que estou com “flow malandro, atraindo a grana, ancestralidade”. Tem todo um lance místico. E eu acho importante passar esse lance para a galera, independentemente da religião. Isso é muito fundamental para mim, manter minha sanidade. Às vezes, a gente se encontra em uma situação que precisa de conselhos…
Com 20 anos, é difícil ouvir conselhos, o que te fez aprender a lidar com isso?
O que eu aprendi é que a gente tem de se blindar porque todo mundo tem seu pensamento —e a gente não sabe o que se passa na mente de ninguém. A gente chega empolgado com alguma ideia e a pessoa não está compartilhando a mesma empolgação, está em uma visão errada na parada. O que eu aprendi, irmão, é entender que a gente tem de estar vigiando; merecendo conquistar o que estamos conquistando. Se eu quero ser um “CEO”, eu preciso viver a vida como um “CEO”, cuidar dos mínimos detalhes. São vários fundamentos, conselhos de vida mesmo, de perseverança: como tratar minha maior riqueza. E isso é apenas um dos conselhos que me ajudaram. Isso é uma coisa que eu estou praticando na minha vida, essa coisa do merecimento.
Com um álbum chamado “CEO”, daqui a pouco vai bombar de e-mail aí com currículos….
O muro está baixo! [Gargalha]