Aos 85 anos, Dona Onete relembra ‘bagaceiras’ e vive auge como compositora de toadas e carimbós
Quarto álbum da compositora faz viagens pela farra e ritmos paraenses
A cantora e compositora Dona Onete, de 85 anos, vive o auge artístico em seu novo álbum, “Bagaceira”, o quarto de inéditas. Nascida em Cachoeira do Arari, interior do Pará, ela iniciou a carreira após os 60 anos. E com voz de galhofa, pelo telefone, foi relembrando à Billboard Brasil sua maior bagaceira.
“Eu estava com duas amigas e não atravessa o rio sozinha”, começa relatando a volta de uma festa em Moju e com o trio tendo que voltar para Iguarapé-Miri, percurso que necessita ser feito atravessando a Baía de Marajó. “Eu não bebia. Elas duas, sim. E eu dependia delas para poder voltar para casa porque eu tinha medo de ir sozinha. Quando eu vi, no meio da ‘bagaceira’ uma veio e disse ‘quem te disse que eu vou [voltar]?’. Ninguém queria. Quando voltamos, na travessia já deu ‘muita bronca’, o nosso barco deu problema no motor… Quando atravessamos, as duas ainda foram convidadas para jogar ‘bilharito’ [bilhar, sinuca]. Fui chegar em casa só uma hora da tarde em casa. Não tinha onde comprar nada, nem comida em casa. E elas ainda foram para a minha casa e depois começaram a chamar muitas pessoas. Quando dei por mim, parecia um aniversário! Teve uma hora que eu saí dos meus limites e joguei todo mundo na rua! Eu tava acabada!”, gargalha ao relembrar a armadilha que caiu.
“Bagaceira”, portanto, é onde tudo pode acontecer, sem hora para acabar. Na faixa-título, ela escreve que “toca brega, toca lambada, toca carimbó, toca guitarrada” e que tem lugar para a “garça namoradeira”, para o “urubu namorador” e que era “um grande tititi” e, ainda, “um enorme zum-zum-zum”. Como tudo que fez nos três álbuns até aqui, a vivência da Ionete da Silveira Gama se confunde com a compositora e cantora Dona Onete e o Pará, o carimbó, e os 25 anos em que foi professora.
“Eu nem chamo de música o que eu faço, são textos! Enormes, pertos desses hits que estão fazendo por aí. Eu sou assim, vou fazendo na minha cabeça. Depois eu monto para ver o ritmo. Mas eu não toco nada! É uma coisa de cabeça, um dom. E se é um dom, vamos aproveitar e deixar isso pra vocês!”, graceja. Além das composições, Dona Onete assumiu também o figurino e a direção da arte da capa, baseada em fotografia do fotógrafo Renato Reis e recriada por Maitê Zara.
Antes de “Bagaceira”, Dona Onete fez sucesso nacional com a estreia de “Feitiço Caboclo”, de 2013, que continha o sucesso “Jamburana”. Três anos depois, emplacou “Banzeiro”, do disco de mesmo nome. Durante os shows desses álbuns, a compositora chegou a reclamar de como era bem recebida em outros estados e que não via tal carinho na terra onde nasceu.
“Olha, Graças a Deus, o carimbó conseguiu. Já temos casas, conjuntinhos que param na cidade e fazem suas festinhas de terreiro e de palco. Ficou meio ‘pavulagem’, sabe? Se você vier ao Pará vai ter dificuldade de saber em qual carimbó você vai dançar”, explica, mais otimista e feliz com a repercussão. “Bagaceira” sai também em LP, com edição especial vinil 180g colorido.
Recentemente, ela foi parceira da conterrânea Luê no álbum “Brasileira do Norte“.