OPINIÃO: ‘O rap hoje é de extrema relevância para o mercado brasileiro’
O empresário Lucas Lang analisa o crescimento do gênero no país
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![OPINIÃO: 'O rap hoje é de extrema relevância para o mercado brasileiro' 1 Lucas Lang, empresário e autoridade do universo do rap (Divulgação)](https://billboard-com-br.s3.amazonaws.com/wp-content/uploads/2024/08/19170638/Lucas-Lang-empresario-e-autoridade-do-universo-do-rap-Divulgacao.webp)
Neste ano, o rap nacional marca forte presença em um dos maiores festivais do mundo, o Rock in Rio, com um dia dedicado totalmente para o gênero. No Palco Sunset, serão seis apresentações do nosso segmento, como MC Cabelinho junto do Coral das Favelas, Orochi recebendo Oruam e Chefin, e Filipe Ret convidando Caio Luccas. Já o Matuê vai cantar com o Teto e o WIU pela primeira vez no Palco Mundo. Além disso, os rappers e trappers figuram no topo das paradas, equilibrando com grandes nomes do funk, do pop e do sertanejo. O gênero se tornou de extrema relevância dentro do mercado da música por mérito dos próprios artistas, e vou explicar o motivo.
Eu sou fundador da MainStreet junto com o Orochi. Conheci ele através da Batalha do Tanque, que acontece em São Gonçalo até hoje. Ele era um moleque muito fora da curva, campeão nacional aos 15 anos de idade, competindo com uma galera bem mais velha que ele. Mal existia a “cena do rap” como conhecemos hoje. Essas batalhas aconteciam em praças nas periferias como eventos sociais, uma forma de cultura para jovens sem acesso a qualquer serviço de lazer.
A tecnologia chegou mudando completamente o sonho dessas pessoas. Quanto mais o YouTube e as redes sociais cresciam no Brasil, mais as batalhas e esses jovens começaram a ganhar notoriedade. O talento deles passou a ser reconhecido e a brincadeira se tornou uma possibilidade de mudança de realidade. Muitos aprenderam sobre produção musical, pois a internet também abriu portas para esse conhecimento. Diferente de gêneros que exigem instrumentistas virtuosos, o funk e o rap podem ser feitos dentro de casa e os artistas entenderam que o modelo das gravadoras ficou para trás e como a internet se tornou a maior impulsionadora dos seus sonhos. Foi aí que as grandes gravadoras pecaram. As majors não viram o talento desses jovens negros e periféricos – e eles tiveram que aprender sozinhos.
Assim foi o início da MainStreet. Orochi usou o dinheiro que fez com seu primeiro sucesso para pagar um aluguel de uma casa em Vargem Grande e transformar em estúdio, convocando todos os amigos para gravarem juntos porque a música seria uma forma de ajudá-los – não só financeiramente, mas mentalmente também. O BIN, por exemplo, foi um jovem que saiu de uma UTI por tentativa de suicídio e foi direto para o estúdio gravar seu primeiro álbum, chamado “Para Todas as Mulheres que Já Rimei”. Seu primeiro hit foi “Marília Mendonça”, que atualmente conta com mais de 200 milhões de plays nas plataformas digitais.
O rap já fazia muito sucesso há tempos na gringa e que era consumido, aqui no Brasil, por pessoas de classe média, pois entendiam a língua (inglês). Pensamos que tínhamos um material humano absurdo capaz de fazer o mesmo trap preto, mas trazendo para a realidade do Rio de Janeiro e do Brasil.
Essa democratização da produção musical não só facilita a propagação e o surgimento de novas vozes, tendo uma renovação de talentos de maneira muito rápida, mas também permite um vínculo totalmente diferente entre os artistas e seus públicos. Como são músicas de mensagem, de crítica social e de fortalecimento da autoestima preta, o rap desempenha um papel fundamental na formação da identidade e do estilo de vida de jovens negros do Rio e do país inteiro.
Diferente da era dos discos, a música, hoje é “de graça” e conseguimos ter acesso ao número exato de ouvintes de um artista nas plataformas. São pessoas que mobilizam milhares de fãs sem precisar da aposta de uma gravadora multinacional. E já que as majors não olharam para seus talentos desde o início, muitos deles decidiram criar suas próprias empresas, propondo um tratamento humanizado para esses jovens – como MainStreet, 30PRAUM, Nadamal e Bairro 13, empresa da qual também sou sócio com o MC Cabelinho.
A postura é marrenta, mas o contrato é familiar. Eles mostram e falam com orgulho sobre dinheiro e conquistas materiais porque sabem as histórias de cada um da cena e suas dificuldades para chegarem onde estão. A tecnologia permitiu ecoar a voz dessas pessoas que estavam invisíveis e que lembram cada porta fechada em suas caras. A cena está promovendo seus próprios eventos, como Rap In Cena Festival, Alma Festival, MainStreet Festival, Plantão Festival, entre outros, porque não aguenta mais ficar na mão de quem não teve as mesmas experiências na vida.
De acordo com o Spotify, em 2022, o Brasil foi o terceiro país do mundo que mais ouviu rap. Em 2023, o trap foi o quinto gênero mais escutado aqui. Para além da música, os artistas da cena também tem circulado em outros ambientes. L7NNON, que bateu diversos recordes nas plataformas, estrelou uma campanha da marca de moda Yves Saint Laurent. MC Cabelinho vai protagonizar uma comédia romântica produzida pelos Estúdios Globo.
Viramos um segmento de extrema importância dentro da indústria musical, com artistas criativos, autênticos, políticos e de lifestyle. Tão forte quanto qualquer gênero musical brasileiro. E isso é pra sempre, historicamente.
*Lucas Lang é empresário artístico da Main Street, Bairro Treze e Batalha do Tanque