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O renascimento de uma estrela: Majur

O renascimento de uma estrela: Majur

Após enfrentar o término de um relacionamento, ela prepara novo disco e turnê

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A cantora Majur

Era 2018 quando Majur recebeu um telefonema que mudaria o curso de sua vida. Seu produtor, Jaguar Andrade, dizia do outro lado da linha que ela deveria apressar-se para encontrarLiniker, cantora vinda do interior de São Paulo que precisava urgentemente de um violão.

Ela concordou e foi. Percorreu a cidade de Salvador feito um foguete para entregar o instrumento nas mãos daquela que seria uma importante mentora em sua carreira. Mais tarde, naquele mesmo dia, Lili ofereceu o palco para o “anjo da guarda” que havia lhe salvado. Cantaram juntas a faixa “Tua”, da paulista, e foi exatamente ali que a maré começou a mudar.

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Poucos meses depois do encontro, Majur reuniu a experiência adquirida nos barzinhos de Salvador e lançou seu primeiro EP, “Colorir”. Com uma voz poderosa, o gingado baiano e imponentes 1,93 m de altura, ela rapidamente chamou a atenção do público e de artistas consagrados, como Daniela Mercury e Carlinhos Brown.

Carregando o título de uma das principais apostas da música brasileira, Majur juntou-se a eles no então inédito Dia Brasil do Rock in Rio 2024, tornando-se a primeira mulher trans a se apresentar no Palco Mundo do festival como parte do show Para Sempre MPB. Nos bastidores do evento, Brown exaltou a importância de nomes como o de Majur para a cena baiana: “Ela também representa essa nova geração”.

Majur no Rock in Rio 2024
Majur no Rock in Rio 2024 (Beatriz Azevedo/Divulgação)

A grande virada na carreira veio em outubro de 2019. Com Emicida e Pabllo Vittar, ela participou da faixa “AmarElo”, que conta com um sample de “Sujeito de Sorte”, de Belchior, e deu uma renovada no espírito dos fãs do já consagrado rapper e das então estreantes Pabllo e Majur.

O clipe tem mais de 16 milhões de visualizações no YouTube e 50 milhões de plays no Spotify. A soma dessas vozes foi certeira e colocou o nome da cantora no mapa nacional. Majur seguiu investindo em sua carreira, lançando singles e colaborações com outros cantores, como Johnny Hooker e Xamã.

Em 2021, outra virada: ela tornou-se a primeira mulher trans a estampar a tradicional capa da revista “Vogue Noiva” e lançou seu primeiro álbum, “Ojunifé”. Casou-se com Josué Amazonas em 2022 e separou-se em setembro de 2023, depois de quatro anos juntos. Viveu o término de forma pública e sentiu na pele tanto os questionamentos quanto o apoio dos fãs. “Eu estava imersa, entregue. Queria publicar o meu amor através de muitas coisas, fotos, tudo”, relembra.

Libriana com ascendente em Escorpião, descreve-se como alguém que guarda muita coisa, mas, no fundo, sente tudo de forma intensa. No mês seguinte ao término, foi banhar-se nos mares de Salvador para celebrar mais um ano de vida e, em novembro seguinte, retomou sua agenda de shows.

Como seu mapa astral sugere, entregava o que tinha de ser feito com um sorriso no rosto, mas sentia as dores do luto quieta, sozinha. “Quando veio a separação, foi um choque para mim. Eu congelei. E eu estava trabalhando. As pessoas que me viam achavam que eu tinha seguido adiante e estava tudo certo. Mas eu estava vivendo à base de remédios e chorava em todos os shows. Era um caos”, conta.

No processo de se reencontrar, Majur recebeu o apoio dos fãs. Durante a edição de 2023 do Festival Psica, em Belém (PA), um grupo juntou-se no fim de sua apresentação para tentar uma foto, uma interação que fosse. Ela se viu na obrigação de se aproximar, mesmo sentindo-se em frangalhos.

Ali, com o acolhimento dos belenenses, chorou feito criança e lavou a alma. Foi o início da cura.

“Eu precisava encontrar a dor para vivê-la. Eu tinha ignorado a dor porque eu precisava trabalhar, não queria parar a minha vida, mas a própria vida me parou.”

Uma nova mulher

Quando o ano de 2024 chegou, tudo tinha um clima de renovação. Majur passou por uma cirurgia importante, sentia a dor do término cada vez mais distante, e estava pronta para recomeçar.

No entanto, as pedras no caminho continuavam a surgir vez ou outra. Seu público estava um tanto confuso. Alguns fãs lhe paravam na rua perguntando sobre o ex, sem saber que eles não estavam mais juntos. “Voltava toda aquela coisa”, conta.

Outros ficaram meio perdidos ao ver a cantora lançando hits melosos, com letras sobre o amor e sobre apaixonar-se, como “Na Sua”. Ela se viu questionando a ausência de um pedacinho naquele quebra-cabeça que sua vida amorosa havia se tornado aos olhos do público. “Percebi que, com as canções que criei, algo estava faltando. Essa foi uma sensação minha, mas também dos meus fãs.”

Diante disso, e com a terapia em dia, Majur sentiu-se quase na obrigação de contar em detalhes a quantas andava o seu coração, como se tivesse um compromisso com os fãs em falar sobre o seu processo.

Foi com esse espírito que veio “Tudo Maré”, música que inicia uma nova fase de sua trajetória profissional e, também, pessoal –mais madura, mais inteira, mais segura de si mesma. “Me joguei no fundo/ E no auge da dor/ Descobri que o amor não é tudo”, diz a letra. “Foi como colocar tudo para fora”, diz a artista sobre a canção. “Ela nos mostra como todas as situações das nossas vidas são como uma maré mesmo… Tudo passa. É como eu me senti, e sobre como eu precisei me reconstruir”.

A faixa é uma espécie de lembrete diário para ela mesma de que o recomeço é possível, independentemente de qualquer outra coisa. Como alguém que ressurgiu das cinzas, ela se apegou ao sentimento de que tudo muda e traz para essa nova era algo diferente do que já havia feito. Para Majur, seu primeiro disco mostra uma artista que ainda estava tentando se encontrar.


Já no segundo, “Arrisca”, de maio de 2023, ela celebrou o amor que sentia no período. “Agora vem eu. A Majur mesmo.” O trabalho é fruto de estudos que ela tem feito sobre claves de matrizes africanas –padrões de ritmos que funcionam como uma espécie de guia, executados com instrumentos percussivos de som agudo.

“Estudei com o Letieres Leite (1959 – 2021), um maestro absoluto. Ele foi um grande professor na minha carreira”, diz Majur, que já molhou o pé nessa água na faixa “Africaniei”, que traz simbolismos de Xangô e Iansã, orixás da umbanda e do candomblé. No novo projeto, Majur canta em iorubá –ou yorùbá, um dos mais de 250 idiomas falados na Nigéria e em alguns outros países da África Ocidental. E também faz menções a outros orixás, mas garante que não se trata de um disco religioso: “É uma música híbrida, feita para tocar a vida das pessoas”.

Para além do mergulho em suas raízes ancestrais, Majur diz que vai seguir cantando sobre o amor. Após ter se entregado a uma relação e de ter vivido o seu término de forma intensa, ela continua sendo fiel ao sentimento que toca seu coração diariamente. “Não consigo não falar sobre o tema”, confessa.

E o amor, nas palavras da cantora, não é só romântico. No processo de autoconhecimento, foi acolhida pelo amor-próprio, aprendeu a ter carinho consigo mesma e quer repassar a mensagem para quem tem ouvido suas músicas de perto durante todo esse tempo.

“Esse movimento também atravessa outras pessoas. Estava mal, foi difícil, mas a vida é isso.” Agora, fortalecida, amplia ainda mais os seus horizontes. Em junho de 2025, Majur se apresenta em Berlim, Dublin e Londres. Sorte do público, que poderá ver o brilho de uma estrela em plena ascensão.

[Esta entrevista foi publicada na 13ª edição da Billboard Brasil. Adquira já a sua aqui!]

Majur
Majur (Jordan Vilas/Divulgação)

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