Você está lendo
O dia em que Salvador Dali expôs o cérebro do roqueiro Alice Cooper

O dia em que Salvador Dali expôs o cérebro do roqueiro Alice Cooper

Cruzamento do roqueiro com o mestre surrealista rolou nos anos 1970

Avatar de Sérgio Martins
IMG 20240819 WA0015

Um dos maiores artistas do século 20, o espanhol Salvador Dalí (1904-1989) saiu maravilhado de uma performance do roqueiro americano Alice Cooper no início dos anos 1970 –que, naquela época, incluía um balé com uma jiboia, assassinato e decapitação em cima do palco. “Dalí encontrou similaridades entre a minha performance e o movimento surrealista. Era como se as pinturas dele ganhassem vida”, explicou o cantor, nascido há 76 anos com o nome de Vincent Furnier. O casamento artístico entre Salvador Dalí e Alice Cooper acabou sendo uma das combinações mais bizarras da história do showbiz.

O primeiro encontro ocorreu em 1973, no St. Regis, hotel luxuoso de Nova York, que abrigou celebridades como o beatle John Lennon (1940-1980) e o escritor Ernest Hemingway (1899-1961). Logo na entrada, Alice foi saudado por cinco figuras andróginas, vestidas de chiffon rosa. Em seguida, Gala, mulher de Dalí, surgiu trajando smoking, cartola e uma bengala. Por fim, veio Dalí. Usava uma roupa listrada, o que lhe dava uma aparência de girafa; casaco de veludo azul e sapatos que pareciam de Aladdin (sim, aquele do gênio da lâmpada). As meias eram de cor púrpura e, detalhe curioso, haviam lhe sido dadas de presente por ninguém menos do que Elvis Presley (1935-1977).

VEJA TAMBÉM
NX Zero

Salvador Dalí, 69 anos, e Alice Cooper, 25, estavam no auge de suas carreiras no momento desse encontro. Os quadros do pintor, tidos como inovadores, continham elementos como truques de perspectiva, ilusões de ótica e hologramas –uma de suas pinturas mais conhecidas é aquela em que o relógio parece “derreter” na tela. Alice, por seu turno, é pai do que se convencionou chamar de “shock rock” (ou rock chocante). Alice é o personagem principal de uma performance bem elaborada, na qual ele é punido com a morte por causa dos horrores que aprontou ao longo do espetáculo. “Alice é um criminoso, não pode sair impune”, explica. A celebração do macabro é acompanhada de canções que se tornaram clássicos do rock, como “I’m Eighteen”, “School’s Out” e, claro, “No More Mr. Nice Guy”.

No primeiro encontro, o roqueiro foi presenteado com uma tiara e um colar de diamantes no valor de US$ 2 milhões. Depois, pediram para que ele tirasse a camisa, vestisse as joias e sentasse numa espécie de roda giratória, onde seguraria uma escultura em miniatura parecida com a Vênus de Milo. Volta e meia, dava dentadas no objeto. No dia seguinte, Dalí surgiu com outra invencionice: “O Cérebro de Alice”. Era um cérebro de cerâmica, decorado por uma bomba de chocolate e com uma pintura de formigas gritando os nomes de Alice e Dalí. “Perguntei se eu poderia ficar com a escultura, e ele gritou: ‘Claro que não! Isso vale milhões’”, diverte-se o roqueiro, lembrando-se da ocasião pitoresca.

Os dois enfrentaram problemas de comunicação por conta das excentricidades do pintor. “Dalí falava cinco línguas e só repetia uma mesma frase com palavras em inglês, francês e espanhol. Numa entrevista que fizemos juntos, me perguntaram como era trabalhar com ele. Eu disse: ‘Não sei, não entendo o que ele fala’. E Dalí respondeu, em inglês perfeito: “Ótimo. O caos é a melhor forma de comunicação”, recorda Alice.

A colaboração entre o pintor de bigode esquisito e o roqueiro findou após essas duas obras. O “Primeiro Retrato Cilíndrico de Cromo Holograma”, nome com o qual Dalí batizou a filmagem rotatória de Alice Cooper, encontra-se em exposição no Museu Dalí, na cidade espanhola de Figueres. Quanto ao cérebro de Alice… “Nunca mais soube dele ou de alguém que tenha pagado milhões pela obra. Provavelmente deve ter se transformado num peso de papel.”

 

*Esta reportagem/coluna/matéria/artigo/entrevista/depoimento foi originalmente publicada na edição #9 da Billboard Brasil impressa, cuja capa é estampada por Gusttavo Lima. Saiba mais sobre essa edição. 

Mynd8

Published by Mynd8 under license from Billboard Media, LLC, a subsidiary of Penske Media Corporation.
Publicado pela Mynd8 sob licença da Billboard Media, LLC, uma subsidiária da Penske Media Corporation.
Todos os direitos reservados. By Zwei Arts.