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Depois do fenômeno ‘Let’s Go 4’, ‘Let’s Go 5’ não surpreende; veja as diferenças

Depois do fenômeno ‘Let’s Go 4’, ‘Let’s Go 5’ não surpreende; veja as diferenças

Com ainda mais minutos, cypher tem novidades sem muito impacto

Avatar de Yuri da BS
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O fenômeno cypher “Let’s Go 4”  ganhou sua aguardada continuação de olho em manter o sucesso anterior e, de quebra, galgar passos em direção a novos nichos de ouvintes. “Let’s Go 5” foi lançada nesta segunda (25) e acumulou mais de um milhão de visualizações em menos de 24 horas por conta da expectativa, do boato da participação de Travis Scott e por novos convidados. Em 2024, a quarta versão do cypher do DJ GBR ficou 36 semanas na liderança do Billboard Brasil Hot 100, ranking das mais ouvidas do Brasil.

A nova versão do cypher mantém a fórmula: MCs homens que comemoram a fartura de dinheiro, mulheres, casas na praia, drogas lícitas e ilícitas e bens de consumo. Por outro lado, ganhou a adição de fenômenos como o carioca MC Poze do Rodo e o novato-sensação MC Tuto, além da presença internacional do rapper Ja Rule.

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Mas, por culpa do fenômeno que foi o volume 4, os 13 minutos de “Let’s Go 5” não conseguem surpreender.

Sucesso garantido, sim; Mas relevância é difícil de repetir

Se a faixa do final de 2024 não sobrepor “Let’s Go 4”, a culpa não será da falta de qualidade da atual “Let’s Go 5”. Musicalmente, as faixas são muito parecidas (e boas) sob o comando do produtor GBR, um artista já estabelecido como um dos ícones da história deste funk que vigora em (e com identidade de) São Paulo e, hoje, atinge o Brasil como um dos maiores gêneros da música pop. O problema? “Let’s Go 4” já é um fenômeno cultural.

“Let’s Go 4” é um retrato musicado dos reis e dos súditos do funk paulistano e também gosta de falar de amor. Um amor que você do Twitter não saberia nem por onde começar a debater e talvez nem consiga ver todos aqueles versos por essa perspectiva. Pela qualidade absurda de composição, os 10 minutos de “Let’s Go 4” formam um musicão que extrapola uma simples descrição do comportamento baseada em consumo —ela, entre outras coisas, também é sobre o consumo do amor.

Por isso, além de falar como um MC faz e gasta seu dinheiro, também é uma canção sobre essa forma de amar. E isso aumenta o capital da parada que chega em um refrão cantado, que manda um recado para quem desacreditou lá atrás. Algo mudou, eu posso e, viu, lembra que eu te falei? É uma resposta, é um diss para alguém.

Com isso, “Let’s Go 4” passa a visão de uma e sobre parcela da sociedade que anda teimosa contra as estatísticas. Em um país de rígida estrutura de desigualdade social, a canção exibiu desde 29 de agosto de 2023 os melhores 10 minutos que um documentário sobre o funk paulistano dos últimos anos poderia contar sobre ascensão, inveja, amor, relacionamento e consumo. A canção foi exportada para todo tipo de subgênero de baile do Brasil: piseiro, reggae, reggaeton. A versão em rock doido paraense, do DJ Josué, é um dos melhores remixes do hit.

Muito possivelmente, “Let’s Go 5” pode em eventual ocasião ultrapassar sua antecessora em número de visualizações. Expectativa, novos atores, engajamento per MC. Mas foi a existência de “Let’s Go 4” quem por último ressignificou os “Let’s Go” que vieram antes e também os que viriam por aí. Para além do clique, estamos falando de uma música que, parecia ter, por habilidade absurda dos MCs que a formularam, um refrão em cada participação —para além do já absurdo estribilho “Let’s go, baby. Let’s, go, baby / Não queria antes, quando a vida não andava / Relacionamento não se encontra por aqui”.

Quer mais?

Faz dançar. Os 113 BPM de “Let’s Go 4”, claro, já ajudam muito porque atuam como um reggaeton que, por vezes, é um grave melódico e forte tocado em ritmo arrastado —costuma-se chamar “rasteiro” (uma espécie de sub-gênero do funk e do reggae no Brasil). Mas a forma como a maioria dos MCs executam suas letras é determinante para que a canção, além de gostosa, torne-se memorável. Em quase todos os momentos da canção, os três elemntos letra, flow e beat não disputam; se complementam. Coisa de quem sabe produzir, coisa de quem sabe compôr e cantar. Coisa de quem domina a música popular brasileira.

Uma música sobre recalque, de amor, sobre sucesso, crime, sexo, tigrinho, silicone, sobre funk, sobre como é ser funk, sobre quem é o funk. Aquilo, certamente, é o funk que é arrasa-quarteirão desde que passou de música de baile de São Paulo para música de baile mundial.

Nesse sentido, a nova “Let’s Go 5” é uma boa canção, tão boa quanto o “Let’s Go” e “Let’s Go 2”, talvez menos expressiva que “Let’s Go 3”. Mas a antecessora, de fato, é a tal.

O que foi mantido em ‘Let’s Go 5’

A quinta versão do cypher segue a fórmula que consagrou as quatro versões até aqui: a presença de MCs linha de frente do funk paulistano cantando sobre uma vida que se assemelha ao jogo GTA —só que vivido em uma realidade de luxo na capital paulista e no litoral paulistano. O maior exemplo da fórmula é MC Ig, um dos maiores fenômenos do funk de São Paulo. De voz marcante, é da responsa dele os versos que abrem “Let’s Go 4” e “Let’s Go 5” —a manutenção da posição indica não só a manutenção da fórmula, mas também o prestígio dado duplamente ao MC. Afinal, começar rimando em uma faixa de mais de 10 minutos é também sinal de que ele será um dos mais ouvidos do país.

Curiosamente, devido ao sucesso do volume anterior, “Let’s Go 5” parece menos forte uma vez que os versos da quarta versão pareciam gigantes desde os primeiros versos. Repetir a capacidade de um hit (longo) cantado à exaustão não é fácil.

Musicalmente falando, a fórmula do DJ GBR é exatamente a mesma: um sample de cordas que em forma de arpeggio (notas de um acorde tocadas uma de cada vez) faz uma espécie de cama tranquila para os versos ansiosos dos MCs. Na quarta versão, os acordes eram simples sol sustenido e ré sustenido que, em tom menor, deixavam um  rastro melancólico na música que remetem às dificuldades pré-fama citadas por cada MC. A tática musical parece traduzir ao ouvinte exatamente o que se canta nas letras: uma vida agitada (seja na vida louca ou na vida boa) que, quase sempre, gosta de descansar em um clima tropical regada à farra.

Além da estrutura melódia, a base do cypher continua: MCs da produtora GR6 disputam espaço em mais de 10 minutos de canção —aqui, quase três a mais do que a versão anterior. Estão lá os remanescentes e reis do gênero MC Ryan, MC PH, MC Don Juan e aspirantes ao posto como MC Luki, MC Kadu, MC GP e TrapLaudo. A faixa conta ainda com MC Marks, presente no volume 1, 2 e 3, e ausente no quarto.

Na lírica, a receita também é não mexer no time que ganha de goleada. Garotas que gostam de dinheiro são bancadas por “papais” que têm o melhor de tudo: carros, maconha, MD, comprimidos, casa, brisa, silicone, progresso, bolsas, iPhone 16. 

Novos tubarões e o ‘tigrinho moiado’: o que mudou em ‘Let’s Go 5’

Se a estrutura é a mesma dos outros volumes do cypher, a quinta versão de “Let’s Go” tem algumas mudanças sutis. A primeira é a adição de MC Poze do Rodo e do norte-americano Ja Rule. Apesar do peso de ambos os nomes, a diferença deles na música é mínima. Ídolo nacional do trap e do funk, Poze é um dos maiores nomes da música popular brasileira após hits como “A Cara do Crime”, “Me Sinto Abençoado”, “Vida Louca”, “Tô Voando Alto”, entre outros. Sua presença em um cypher paulistano é conceitualmente significativa: associado ao Comando Vermelho (facção dominante do narcotráfico do Rio de Janeiro), o MC é persona non grata em São Paulo (dominada pelo Primeiro Comando da Capital, rival da facção carioca).

Poze não é reconhecido como um grande compositor e o que os bastidores do trap deixam exposto é que o trapper recorre a parceiros para compor suas letras. Em “Let’s Go 5”, sua presença é pouco sentida liricamente, ficando marcada pela voz rouca e característica. Sua participação no clipe também não é destacada, tendo sido gravada ao lado de MC Ryan, mas longe do clima que domina o vídeo

A presença de Ja Rule segue o mesmo esquema: surpreende inicialmente, mas é esquecível. Suas rimas são as últimas a marcar presença no cypher e só não serão esquecidas porque a batida que acompanha sua voz muda do funk rasteiro para um gangsta rap. Mas a brisa é rápida.

Se não surpreende liricamente, “Let’s Go 5” atualiza como é a vida de um playboy gangsta na virada para 2025: criptomoedas (“Uns milhões em cripto e seu silili tá pago”, diz MC Ryan), movimentação sigilosa (“Muita roncaria, eu tô vivendo, mas não posto”, também de Ryan, denunciado em 2024 por agressão à esposa, apreensão de carro e “fuga” do Rock In Rio 2024), novas táticas lisérgicas (“Joga o comprimido na água gelada que te alucina”, diz MC PH fazendo alusão à “balinha” presente em “Let’s Go 4”), novos recortes sociais (“Os moleque de BYD, as da PUC pula’ ni mim”, diz MC Luki citando o carro da fabricante chinesa que ultrapassou a Tesla e a Pontifícia Universidade Católica, prestigiada [e cara] instituição do ensino superior).

Além disso, há uma menção honrosa ao jogo do Tigrinho —moda entre quem era e não era gangster em 2024 e que deu e tirou muito dinheiro em meio a uma farra de golpes. No clipe de “Let’s Go 4”, os MCs chegam a mostrar uma tela do jogo durante os versos “Elas quer foder com nóis que é chefe / rico bem novinhoBanca silicone / só jogando no tigrinho”. Já quase em 2025, MC Don Juan diz: “O tigrinho tá moiado, mas nós já batemos a meta”.

‘As do job’: a grande diferença é visual

É claro que, se não há muitas diferenças entre o quarto e o quinto volume de “Let’s Go”, estamos falando de um audiovisual que, além de jóias, carros e bebida, dá muito destaque às mulheres. No caso, a presença feminina é marcada como um acessório: estão ali cumprindo um papel quase simbiótico —onde elas se beneficiam do luxo dado pelos MCs e eles se beneficiam pela companhia de aviões siliconados e bem vestidos.

No entanto, a diferença marcante entre “Let’s Go 4” e “Let’s Go 5” é visual. Na quarta edição, a presença feminina era pouco protagonista. Aparecia, sim, mas o destaque maior sempre foi dado aos MCs. No quinto volume, a coisa mudou de vez.

A transição de 2024 para 2025 no mundo do funk ficou marcado pela novidade do termo “do job”, que designa acompanhantes de luxo. É dessa forma que a maioria dos MCs se relaciona na vida real: o dinheiro atraí esse tipo de relacionamento que vai sendo contado em músicas como “A Filha do Deputado”.

Em “Let’s Go 5”, boa parte das cenas dos primeiros cinco minutos do bololô é protagonizada por um tipo específico dessa presença feminina: cabelos alisados, maquiagens fortíssimas e silicone —muito silicone. Em uma das cenas, uma taça de bebida é despejada nos seios de uma das modelos. Os únicos a não citarem mulheres na canção são justamente os convidados de fora da GR6: Ja Rule e Poze do Rodo —que, recentemente, vem se mostrando fiel ao relacionamento com Vivi Noronha (com direito a uma canção homenagem chamada “Morena” e lançada no final de 2024).

De resto, elas são mencionadas por todos os MCs. IG diz “Eu tô sempre charrado, lotado de amiga / Essas garota’ que sabem viver a vida / Ela pelada no Apple Vision, tipo o Ney’, o pai tá on”; Depois de falar dos investimentos em cripto, Ryan diz “Lipo HD, eu te deixo montada / Não é querendo paga, te aposento”; MC PH diz “Aqui tu pode dar o celular / Tu pode dar pra quem quiser comer / Só fica à vontade na casa do chefe que banca sua brisa / Tem vinte piranha jogada, pelada na sala e piscina”; Antes de citar o BYD e a PUC, MC Luki diz: “Ela faz grana com story, vende conteúdo” e, depois, complementa “Elas quer ir jantar no Bololô / As puta’ cara’, os invejoso tem de monte o IG que falou”; MC PH diz “Traz uma amiga maneira, mas vem sem ciúmes / Senta pro tio Don e pro Gordinho de costume”; MC Marks diz “Em outras alameda’, eu brinquei com as ninfeta’ / Não é que eu comi todas, é que elas quis me, ha / É festa da zorra total, legal, jet na capital / Que tal? Convoca as bebê do litoral, legal / Que tá normal” e por aí vai.

Novato sensação passa em branco; Luuky e Kadu roubam cena

Se a faixa não surpreende na voz dos tubarões, também não ganha fôlego com os novatos. A sensação MC Tuto é um dos que passam despercebidos em “Let’s Go 5”, por exemplo. Responsável pelos hits “Barbie” e “A Danada Me Ligando“, o MC surge com voz rouca e talvez a mais baixa da mixagem —sem versos memoráveis e já no oitavo minuto da canção.

Já MC Luuky se destaca porque, em meio a versos cansados anteriores, é dono de alguma ousadia na canção. Se Ryan diz que quer ficar na encolha, sem postar muito, Luuky é quem desvenda um gangsta menos tímido e, de quebra, acaba citando dois fenômenos: o cantor e compositor Grelo e a frase mais famosa do final de 2024: “não sufoque o artista”. Aos 9:20 ele diz “Passar as férias em Angra / na lancha tocando Grelo”, criando uma relação entre dois ícones da música popular brasileira recente —Grelo foi um dos artistas mais ouvidos de 2024 após compôr “Só Fé” e recriar “Vida Loka Pt. 1”, dos Racionais MCs.

Outro destaque também é novato na saga “Let’s Go”. MC Kadu é responsável por uma cadência mais ritmada ao final da canção. Seu jeito de cantar e as menções ao DJ GBR e ao MC IG dão destaque metalinguístico à canção e criam um trecho memorável (e raro nessa edição) com “Let’s go, sem amor, como eu tô?”.

Dito isso, que venha o sexto.

 

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