O que explica a ausência do reggaeton nos charts brasileiros?
Produtores explicam o fenômeno e o que pode ser feito para expandir o gênero
A música urbana de língua hispânica conquistou o mundo, especialmente o reggaeton. O ritmo de origem porto-riquenha domina as altas posições dos charts e paradas globais, mas no Brasil a história é diferente. Um dos principais nomes da cena é o porto-riquenho Bad Bunny. Ele foi o artista global mais escutado do Spotify por três anos consecutivos. “Un Verano Sin Ti” é o álbum mais reproduzido da história da plataforma até agora.
Com influências do dancehall, hip hop e reggae, o gênero latino nasceu entre as décadas de 1980 e 1990. Assim como o nosso funk, o reggaeton surgiu nas ruas e foi marginalizado até ser aceito socialmente.
Até estrelas como Beyoncé, Madonna, Drake, Justin Bieber e The Weeknd (entre muitos outros) se renderam às batidas envolventes. Além de Porto Rico, o reggaeton conta com uma forte cena na Colômbia. O país exporta todos os anos artistas para o estrelato internacional. J Balvin, Karol G, Feid e Maluma são alguns deles.
Hits pontuais, como “Envolver”, de Anitta, “Gasolina”, de Daddy Yankee, e “Despacito”, com Luis Fonsi, acabaram emplacando no Brasil. Anitta foi uma das primeiras a impulsionar o ritmo por aqui. Com faixas como “Sim ou Não”, com Maluma, e “Ginza Remix”, com J Balvin, a carioca fez um novo público olhar para o gênero.
Mas… mesmo sendo gigante no mundo, o reggaeton não mostra a mesma força nas paradas brasileiras. O que explica essa ausência nos charts daqui?
A Billboard Brasil conversou com produtores conhecidos da cena latina no Brasil e na Colômbia para analisar os motivos do gênero não competir pelo topo dos charts. O primeiro deles é a promoção dos artistas pelas gravadoras e a conscientização sobre o mercado brasileiro.
Segundo César Figueiredo, da agência de gerenciamento artístico Central Sonora, esse é o maior desafio de um artista latino e é como um recomeço de carreira. A empresa é o braço brasileiro da gravadora WK Entertainment, responsável por Maluma, CNCO, Wisin, Emilia, entre outros:
O artista vai lembrar que vai deixar seu país, onde tem notoriedade, milhões de ouvintes, cachê altíssimo, e vai para um território onde ninguém o conhece. Empresários e artistas precisam entender que é um caminho a ser trilhado
a longo prazo.
Segundo o Spotify, o consumo de música urbana latina no Brasil aumentou 13% entre 2021 e 2022. Os cinco artistas latinos mais escutados do estilo, excluindo-se os brasileiros, foram: Mariah Angeliq, J Balvin, Bad Bunny, Karol G e Maluma.
Queridinhos do público
Para o empresário, a estratégia deve aproximar o artista do público com aparições em programas, de TV, ter uma boa agenda de imprensa e lançamentos estratégicos mirando o mercado brasileiro.
“Fazer com que eles gravem em português. Se um artista brasileiro faz um esforço gravando em outra língua, o esforço precisa ser recíproco para cá. Isso faz com que o público se identifique com o artista, ver que ele está se esforçando para nos agradar. Isso, culturalmente, faz uma diferença”, acrescenta Figueiredo.
Quem concorda com o empresário é o trio Los Brasileros, formado por Dan Valbusa, Pedro Dash e Marcelinho Ferraz. Os produtores são responsáveis por sucessos de artistas nacionais como Anitta, Jão, Carol Biazin e Lagum, mas também trabalharam com nomes de destaque na cena latina hispânica como Karol G, Feid e Prince Royce.
“As gravadoras têm que continuar investindo na entrada do reggaeton no Brasil, porque é questão de costume. A batida é boa, as produções são incríveis, as melodias são fodas. É um idioma que se aproxima mais do nosso. Os artistas também precisam fazer parcerias com brasileiros. Precisa também ter um interesse dessa galera para que a música deles pegue aqui”, afirma Dash. “É totalmente pela língua. O ritmo pega aqui. Vem um sertanejo, faz um reggaeton e bomba”, concorda Ferraz.
Para Rafael Takano, idealizador da festa latina ¡Súbete!, em São Paulo, agradar os fãs brasileiros é fundamental para a entrada no mercado.
A gente ama ser notado. Uma legenda em português nos vídeos, usar uma camisa do Brasil… Falta um pouco disso. É um direcionamento que precisa vir das gravadoras. Por ter essa dinâmica continental, elas são focadas no Brasil e têm pouca troca com as filiais da América Latina no geral.
Além do tamanho continental, o Brasil é o único país da América Latina que fala português. Por outro lado, existem fenômenos de língua hispânica, como RBD e Shakira, que movem grande público e facilmente lotam estádios.
O colombiano Alejo Cardona, CEO do clube Perro Negro, a maior balada de reggaeton da Colômbia, acredita que a língua não é determinante para a ausência do gênero nos charts. “Não acho que seja o idioma, o Brasil é muito forte em seus próprios gêneros. Consomem muito sua própria música e têm um mercado interno muito forte”, pontua o empresário.
Nas telinhas
Atualmente, o funk, trap e sertanejo dominam as músicas mais ouvidas no país. O mercado brasileiro de música gravada é o 11º maior do mundo. Devido ao seu tamanho territorial, para um ritmo virar sensação, ele precisa ser massificado.
Para Rafael, a TV foi a responsável pelos fenômenos RBD e Shakira nos anos 2000:
Vieram do SBT. O Brasil inteiro assistia a ‘Rebelde’. Shakira começou a carreira aqui no ‘Domingo Legal’ e teve trilha sonora em novela. Alejandro Sanz e Maná também. Os latinos grandes aqui tiveram esse ponto de entrada massificado. Os reggaetoneros, não.
Segundo ele, as produtoras também precisam se aproximar da comunidade latina no país e oferecer ingressos mais acessíveis para shows. A presença do reggaeton já é uma realidade no Brasil, mas é ofuscada pelos demais estilos musicais do país. “Tem muito consumo, só que fica diluído nesse gigantismo brasileiro”, finaliza Rafael.