Com grandes shows de Air e Gossip, C6 Fest esgota ingressos no Ibirapuera
Festival aconteceu em São Paulo neste sábado (24)
O terceiro dia de C6 Fest 2025 confirmou a expectativa de muitos dos corajosos que encararam o alto valor dos ingressos do festival para conferir Perfume Genius, A.G. Cook, Gossip e Pretenders – todos responsáveis pelos (bons) shows deste sábado (24), precedentes de Air, o grande momento do dia.
Os valores podiam chegar a R$ 2,2 mil (sendo R$ 1 mil o passaporte para os dois primeiros dias no Auditório Ibirapuera e mais R$ 1,2 mil dos outros dois dias no parque) e, mesmo assim, não assustou um público que lotou os dois principais palcos do festival.
Antes de conferir um espetáculo a céu aberto realizado pelo duo francês Air, quem chegou mais cedo viu um sedutor errante Perfume Genius alternar entre o country pop e o rock torto; um A.G. Cook que fez baile de hyperpop very girly; Chrissie Hynde, aos 73 anos, comandando seus pupilos de banda no Pretenders com elegância e uma deliciosa Beth Ditto no comando de um Gossip dançante e que amaciou a carne para o principal espetáculo da noite.
Realizado no mesmo final de semana da Virada Cultural, o evento gerava um questionamento inevitável sobre elitização da cultura, mas também sobre como o luxo oferecido no festival (um som límpido e raro, telão absurdamente gigante, pouquíssima poluição visual) contrasta com certos pontos como, por exemplo, a exclusão de artistas brasileiros nos horários mais contundentes do festival.
Amaro Freitas, por exemplo, foi visto por raros espectadores dos dois jazzy-primeiros dias – ele tocou na sexta (23), e poderia, com certeza, estar em horários preenchidos por atrações que, apesar de ótimas, apontam muito menos tendência e relevância na música mundial contemporânea.
Como foi o show de Perfume Genius no C6 Fest
Um show focado na alma do artista, Perfume Genius é desses performers que não precisam de muito para brilhar no palco. Praticamente sem cenografia e com poucos músicos em cena, o americano se entrega ao canto e a uma dança performática sozinho palco, usando apenas seu carisma, uma calça jeans e uma camiseta cropped.
Alternando entre momentos experimentais e um pop quase doce, metade do show foi dedicado às canções de “Glory”, recém lançado décimo álbum da carreira, repertório que empolgou os fãs que preencheram a arena Met Life. Ao outro espectro do público, então, restou esperar para ver onde dava. E deu.
Às vezes com cara de safado doido, aquela mistura de Thom Yorke com Matheus Nachtergaele ia deslizando de forma sexy-errante pelo palco e, de repente, começou a enfileirar rocks tortos de seu álbum “Set My Heart On Fire Immediately”. De tom nitidamente mais agoniante, desesperador, sufocado, o registro foi um deleite ao vivo para aqueles em busca de uma diversão mais pontiaguda, menos confortável.
Como foi o show de Pretenders no C6 Fest
Um deleite para fãs de rock feminista, o show dos veteranos Pretenders prendeu a atenção do público mais maduro presente no festival, num daqueles momentos escolha de Sofia, já que a atração divida quase o mesmo horário da sensação indie Gossip, que tocava no palco Met Life.
Quem escolheu ficar na Arena Heineken, palco que usava como base o Auditório Ibirapuera, viu a band leader Chrissie Hynde desfilar sua elegância de rock star longeva em um palco que era seu. Solidária, ela viu seu trio instrumental trazer o ácido do rock e do country de sua cidade natal, Ohio, enquanto cantava clássicos como “Private Life” e “Back on The Chain Gang” e dizia que amava São Paulo (ela morou na cidade por alguns meses durante turnê com Moreno Veloso).
Como foi o show de A. G. Cook no C6 Fest
O britânico A. G. Cook tinha uma missão: comprovar que ele era o diferentão da noite —principalmente para parte do público que, mais adulto, não viveu aquilo que conduz o coração do produtor na música. Ele faz parte de uma geração de artistas que delirou quando um fenômeno chamado Skrillex apontou na música mundial, entortando frequências e criando espaços de rave que mais pareciam shows de rock —e não era qualquer rock, mas sim tudo aquilo que puxa para o lado do emocore, do hardcore, ou do punk.
Mas, como a vida é muito da curiosa, tudo isso veio despencar não em algo literalmente “rock”, mas em um gênero/lifestyle chamado hyperpop – que ele ajudou a cunhar por meio de seu trabalho como produtor executivo na gravadora PC Music e também atuando na carreira da cantora sensação Charli XCX.
Então, a apresentação do produtor foi percebida em partes pelo público. Primeiro, como DJ, o público sacudiu as barraquinhas ao som de uma penca de remixes que passeiam pelo repertório de gente que ele produz (como a Charli) mas era tudo confortavelmente picotado, sonoramente ampliado —os timbres, por vezes, queriam te sufocar com chiados, o que acabava não acontecendo tamanho esmero de qualidade de sua arquitetura e trabalho de ourives nos beats. Então, a sensação era de bailão: mas um bailão bem garota: com vontade de bater leque, “um padê”, uma bolsinha a tiracolo e se jogar num bate cabeça.
A performance era sincronizada com uma arte hipnótica e psicodélica que não chegava a ser “geometria-sagrada-anos-70”, mas sim uma viagem composta pelo artista visual Timothy Luke, responsável pela linda capa de “Britpop”, lançado em 2024 por Cook.
De repente, às vezes, ele pegava o microfone e cantava com o autotune torando, dando a impressão de um videokê confessional – o público amou. Mas aí, viciado em bater cabeça, ele ia para as carrapetas e fazia do C6 um inferno. Showzão.
Como foi o show de Gossip no C6 Fest
Um dos shows mais aguardados desta terceira edição do C6 Fest era a apresentação do Gossip. O power trio liderado pela vocalista Beth Ditto fez um show com energia no talo, para fãs de indie rock barulhento. A cantora, que já havia cancelado apresentações no país no passado, estava extremamente comunicativa e feliz com a energia do público.
“Eu sei duas palavras em português, ‘obrigada’ e ‘bunda, que aprendi com uma intercambiária que conheci na minha cidade quando tinha 19 anos”, comentou, arrancando gritos da plateia.
A banda fez a tenda Metlife ficar pequena, lotada de fãs que cantavam as letras de clássicos como “Stanging in The Way of Control” e “Heavy Cross”. Foi um show com energia no talo do começo ao fim, com total comunhão entre a banda e público.
Air, os robôs quentes da noite
O duo de Versailles chegou ao C6 Fest como um dos responsáveis por esgotar os ingressos do sábado (segundo a organização do festival, foram vendidos 13 mil ingressos). De natureza sofisticada, a escalação da dupla francesa veio totalmente a calhar com a atmosfera cool do festival, sobretudo porque eles trariam ao público o show do álbum “Moon Safari”, que completou 25 anos em 2023.
O disco foi tocado em sua totalidade, com todas as suas nuances de uma música eletrônica quente, com foco nos sintetizadores, vocoders e linhas de baixo na frente, além das vozes robóticas que Jean-Benoît Dunkel e Nicolas Godin entregam com ajuda do processador Korg Digital, que transforma os vocais numa textura robótica.
Com auxílio de um hábil baterista, a dupla reproduziu no palco do C6 Fest à risca as celebradas faixas do disco lançado em 1998, que entrou para o rol dos queridinhos dos amantes de uma música eletrônica mais requintada.
Com o público atento e animado com cada início das músicas, a dupla fez seu show elegante, meticuloso e quente, se concentrando em executar com primor cada música do álbum. A não ser por hits como “Sexy Boy” e “Kelly Watch The Stars”, o público se manteve introspectivo, obedecendo à vibe intimista do show.
Após apresentar as 10 músicas de “Moon Safari”, com duração de pouco mais de 40 minutos, o duo voltou ao palco para um bis que trouxe hits da carreira, como “Cherry Blossom Girl” e “Highschool Lover”. Foi um gatilho para o público que, ao final, ficou com vontade de pista e lotou o Pacubra, palco indoor dedicado a DJ sets.