Aniversariante em fuga e 208 horas no portão: os fãs da fila do Stray Kids no RJ
Conheça a história de fãs que estão há dois meses na fila para show de K-Pop


O dia de hoje, 1º de abril, marca a estreia do Stray Kids, um fenômeno do K-Pop que ultrapassa a marca de 10 milhões de ouvintes mensais, no Brasil.
Formado por Bang Chan, Lee Know, Changbin, Hyunjin, Han, Felix, Seungmin e I.N., o grupo traz ao país a turnê “DominATE”, sua terceira excursão mundial que inclui também dois shows em São Paulo, nos dias 5 e 6 de abril.
Com as vendas dos ingressos iniciadas ainda em 2024, os fãs estão, há meses, se mobilizando para assistir ao Stray Kids, formando grupos comunitários na internet para garantir os melhores lugares nos shows.
Desde primeiro de fevereiro, há exatos dois meses, um grupo de cerca de 40 jovens faz uma verdadeira vigília nos portões do Estádio Nilton Santos, o Engenhão, localizado no bairro do Engenho de Dentro, Zona Norte do Rio de Janeiro.
A última madrugada antes do Stray Kids
Foi o dia de guardar as barracas, arrumar as malas, e deixar tudo arrumado na hospedagem que foi revezada por quarenta jovens em frente ao estádio. Nos últimos dias, a população ao redor do Engenhão cresceu.
Julia, uma das acampadas revelou que, desde sábado, quando a banda desembarcou no Aeroporto Tom Jobim, o número de acampados aumentou: “Eu saí para tentar ver a chegada deles e, quando voltei, tomei um susto. Antes eram só quatro barracas e na volta contei quinze!”.

No geral, os fãs declaram que a madrugada do dia 1º foi tranquila nos arredores do Engenhão, sem relatos de assaltos ou confusões. Silvana Freitas, de 55 anos, chegou na noite de ontem para acompanhar a filha, de 18 anos.
Apenas a estudante irá ao show, enquanto a mãe retornará para casa, em Nova Iguaçu, para esperar a apresentação terminar e, então, voltar para buscar a filha: “Cheguei aqui por volta de 20h30, não consegui dormir. Foi uma noite tranquila, tinha policiamento e muitos fãs. A minha filha está muito ansiosa, compramos o ingresso com muito sacrifício, mas ver ela tão feliz faz todo esse esforço valer à pena”.
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Outra fã, Natália, mora no Rio, mas preferiu dormir próximo ao estádio. Segundo ela, sai mais barato alugar um cômodo próximo ao Engenhão do que fazer as viagens de ida e volta através de um carro de aplicativo.
A STAY (nome dado ao público do grupo) chegou ao local do show por volta das 3h da manhã, “um momento em que as ruas no entorno estavam desertas, mas havia policiamento na região mais próxima do Nilton Santos”.
Por volta das 6h da manhã que os fãs começaram a chegar em peso. Às 8h, as filas já se estendiam pelos arredores do Engenhão nos dois sentidos. Apesar do número de pessoas impressionar, Rebeca Curty, que trabalha na orientação dos espectadores, avalia a manhã como calma: “Aparentemente tudo vai correr sem problemas, os próprios fãs se organizam, são poucos que vem tirar dúvidas com a gente. Também trabalhei no show da Shakira e a região estava muito mais tumultuada, hoje o grande problema está sendo o calor”.

Apesar de os termômetros da via marcarem 31 graus nesta manhã, a sensação térmica era muito maior. Sombrinhas, leques e garrafas d’água compunham o cenário junto dos diversos jovens – na sua esmagadora maioria, do sexo feminino – vestidos com fantasias, perucas, pulseiras, acessórios com imagens do Stray Kids e cabelos coloridos.
Em busca de amenizar a situação, a organização do evento distribuía água, protetor solar e usava vaporizadores para refrescar a multidão. Segundo relatos dos fãs, nos dias anteriores ao evento, os serviços também foram oferecidos.
A longa peregrinação
O show do Stray Kids trouxe para o Rio de Janeiro fãs de todo o Brasil. Vinda da cidade de Taquara, no Rio Grande do Sul, Jaqueline Pechlin, de 46 anos, deixou sua loja de produtos agropecuários nas mãos da sócia, sua irmã, para assistir ao show: “Estou acampada desde sábado. Tem sido uma experiência muito legal, estou conhecendo gente de vários lugares do país. Estou muito cansada, mas está valendo a pena”, contou a gaúcha.
Jaqueline diz que a vinda para o show tem um significado muito forte para ela, já que a banda a ajudou a superar um momento difícil: “Eu fui me interessando pelo K-Pop através dos doramas. O Stray Kids apareceu na minha vida na época em que minha mãe faleceu, e comecei a me abraçar com a música deles”. Depois da apresentação, a comerciante irá direto para o aeroporto, encerrando a jornada de quatro dias no Rio de Janeiro.
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Da região Norte do país, as amigas Giovana Paiva e Alda Pacheco, estudantes, de respectivamente, 20 e 22 anos, vieram assistir ao show. Na fila também desde o dia 28, a piauiense Noemi se juntou a elas. De forma descontraída, o trio explica a motivação para atravessar o Brasil para assistir ao Stray Kids: “Primeiramente, nós somos loucas. Estamos fazendo tudo isso por oito machos, mas é amor de fã. Só quem é entende. Ficamos aqui esses dias todos porque queremos ver o show nos melhores lugares”.
Debatendo quem havia passado os maiores perrengues na viagem, Alda foi vencedora, considerando as horas de voo enfrentadas: “Eu saí de Macapá para Belém, depois esperei 10 horas em Recife para pegar o avião para o Rio. Na volta, terei que esperar 18 horas em São Paulo, mas pelo menos será um voo direto”.

Aniversariante em fuga
Uma das histórias mais curiosas contadas na fila é a da jovem Hannah [nome fictício], estudante de biotecnologia que veio do Amazonas faltando no trabalho e na faculdade para comemorar seu aniversário de 21 anos no show do Stray Kids.
No dia 25, a jovem encerrou o dia no emprego e pegou um voo com destino para o Rio de Janeiro, fazendo escala em São Paulo e, desde então, não aparece nem para as aulas nem para o trabalho.
Sobre a aventura, a aniversariante conta: “Eu venho me planejando para o comemorar meu aniversário nesse show há meses. Virei fã do grupo na pandemia, e desde então eu acompanho, curto todos os lançamentos. É um tipo de música que me ajuda a me sentir mais tranquila, gosto das letras mas o que prende muito são as batidas, o lado instrumental. Me dá muita energia, levanta o meu astral, faz com que eu me sinta menos solitária”.
Hannah diz que, mesmo antes de partir, já está sentindo saudades do Rio de Janeiro.
“A força comunitária dos fãs fez com que alimentação, lugar para dormir, tomar banho, fosse tudo muito tranquilo. Nós nos tornamos uma grande família, fizemos todo um suporte para nos suprir até o fim do show. Foram noites tranquilas, consegui turistar, jogamos Uno, e hoje à meia noite cantaram parabéns para mim, me senti muito querida e vai ser muito estranho voltar para a realidade”.

As recordistas do banco de horas
Entre os fãs que passaram mais tempo no revezamento de horas do acampamento, a estudante Julia, de 19 anos, previamente citada, foi a campeã, com 208 horas dedicadas à espera da abertura dos portões. Mesmo morando no Rio de Janeiro, a jovem foi pelo menos quatro vezes por semana ao acampamento e, nos últimos sete dias, fez escalas diariamente.
Esse não é o primeiro acampamento pré-show de Julia. Quando o BTS se apresentou em São Paulo, em 2019, ela tinha apenas 15 anos, e acampou junto da mãe. Em 2023, foi a vez da estudante aguardar por Taylor Swift na fila. Sobre os acampamentos, a jovem revela: “É uma verdadeira experiência. O povo pensa que quem acampa aqui não faz nada, mas a gente estuda, trabalha, se organiza em uma escala”.
Acampada desde o dia 1º de fevereiro, Julia começou a acompanhar o Stray Kids quando o grupo ainda estava se formando, no reality show promovido pela JYP Entertainment, em 2017.
Desde então, a estudante aguarda por uma apresentação da banda no Brasil, e revela que esse foi o período mais longo que passou em uma fila: “Nos outros shows foram só alguns dias, semanas. Dessa vez durou dois meses e finalmente hoje se encerra. Eu ainda não estou sentindo muita coisa, nem ansiedade nem nervosismo. Acho que quando eu entrar no show é que eu vou descarregar tudo e pensar: ‘Ufa, agora acabou, não aguento mais’”.
Em segundo lugar no banco de horas do grupo está Aryel Scott, que passou 122 horas na fila ao longo de dois meses. A estudante aproveitou o fim das férias para passar mais tempo no acampamento e, quando as aulas retornaram, passou a se reunir com os outros fãs no tempo livre.
“Somos quarenta pessoas que se revezaram em turnos de no mínimo seis horas. Várias vezes dormi aqui e fui direto para a aula, na Barra da Tijuca, que fica há uns 15 quilômetros daqui. Foi tudo muito harmonioso, as únicas confusões que aconteceram foram no momento de a gente se organizar, mas tudo foi resolvido com conversa”, revela.
Com ingresso comprado para a pista premium, Aryel acordou hoje às cinco da manhã para seu turno na fila. Segundo a fã, as expectativas do show são altas: “Conheci o K-Pop pelo BTS e depois uma amiga me apresentou o Stray Kids. É inexplicável, eles trabalham muito bem, eles entregam tudo, não sei explicar em palavras. É surreal. Estou muito ansiosa”.
Agitando o Engenho de Dentro
Na estrada com a turnê “DominATE” desde agosto de 2024, o Stray Kids tem feito apresentações com um setlist de mais de 30 músicas e cerca de duas horas e meia de duração, um show que promete agitar a noite no Engenhão. Moradores e trabalhadores do Engenho de Dentro dividem opiniões sobre a movimentação que eventos de grande porte como este trazem para o bairro.
Gilmar Pedro administra imóveis na Vila da Rua das Oficinas que são alugados por fãs de artistas que se apresentam no estádio. Além da hospedagem, oferecem serviços como banho (R$ 10), banheiro (R$ 5) e guarda volumes (R$ 20). É nestes alojamentos que Julia, Aryel, Hannah e outras 37 fãs se instalaram nos últimos dois meses.
O administrador revela que, para a hospedaria, um evento como esse é sempre benéfico: “Essas meninas estão aqui há quase 60 dias e não trouxeram nenhum aborrecimento. Tenho que bater palma para elas, são fãs mesmo. Foi a segunda maior estadia que tivemos aqui, depois de um grupo que ficou por três meses para o show do RBD. A gente faz muitas amizades, vem pessoas de várias idades, então vale à pena fazer essa ligação com o público”.
Próximo à hospedaria, a pensão Delícias da Fafá oferece serviços de alimentação para os espectadores do show. Segundo a atendente Julia, a previsão para hoje é que vendam até o fim do show entre 150 e 300 refeições, além de água, açaí e refrigerantes. “Shows grandes assim dão bastante retorno, ajudam bastante na nossa renda e conhecemos várias pessoas de outros estados, vale muito à pena”, comenta.
Quem também se beneficia com os eventos são os camelôs, que vendem desde acessórios ligados aos artistas até carregadores portáteis, leques e bebidas. Leandro Silva, de 43 anos, é eletricista e, nas horas vagas, ganha a vida vendendo produtos para fãs em filas de shows.
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O comerciante revela que adquire produtos com revendedores de São Paulo e passa o dia todo na fila para fazer um dinheiro extra: “Já consegui fazer algumas vendas e acredito que à noite vai melhorar muito. Estive aqui no show do RBD e da Shakira também, hoje tá um dia legal para quem está vendendo. Mas está muito calor, esses jovens que estão na fila tem que se cuidar e beber bastante água, porque isso que eles fazem, para mim, é coisa de doido”.
Contudo, não são todos na região do Engenho de Dentro que se beneficiam com os eventos. Para o mecânico Denilson Oliveira, tanto os jogos de futebol quanto os shows prejudicam os serviços da oficina onde trabalha: “Essas atrações geram muito trânsito e a gente acaba não podendo deixar carros do lado de fora da oficina, então são dias em que tudo se torna mais difícil, acaba sendo vantagem mesmo só para quem tem restaurante, outros tipos de comércio”.
Embora tenha preferido manter sua identidade oculta, um entregador do comércio local declarou sua indignação com o show do Stray Kids: “Eu acho um absurdo, está tudo um caos. Estamos com entregas acumuladas e atrasadas porque não dá para se locomover pelo bairro. Tem gente que está aqui há semanas para ver o show, duvido que se fosse para fazer o Enem esses jovens ficariam dias em uma fila”.
Já Alexandre, motorista de carro de aplicativo, mostrou seu descontentamento de forma descontraída: “Dois meses em uma fila? Só se for para ver Jesus Cristo!”.
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