Seria Raffa Moreira um visionário incompreendido do trap?
Cantor, que foi alvo de deboche pelo seu estilo, hoje é tido como precursor
A música urbana está no topo dos charts no Brasil – e isso inclui o trap. Falando especificamente deste gênero, Raffa Moreira foi um dos primeiros a desbravar um cenário pouco conhecido no país, lá em meados de 2017. Como todo pioneiro, Raffa não teve vida fácil.
Na época, o rapper era ridicularizado pelas roupas justas, pelo comportamento caricato, pelas letras carregadas de gírias em inglês e pouco nexo entre as linhas de rima. Hoje, ele encara uma espécie de fila virtual para pedidos de desculpas.
Seu primeiro grande sucesso, “Bro”, começava com os seguintes versos:
Bro, faz sol
Camisa da FERNVNDX Clothing
Eu soquei um hater no shopping
Que falou bosta
A composição, cheia de ad-libs (espécie de improviso sonoro com o uso de efeitos produzidos pelos próprios cantores) e menção a marcas internacionais, gerou uma mistura de críticas e deboche sobre o trabalho de Raffa Moreira.
Com o objetivo de chocar, ele diz não ter ligado muito para o hate.
“Eu entrei no jogo querendo ser um rapper controverso mesmo. Eu sabia que teria hate, mas gerei impacto. Naquela época, não fui só mais um, fiz algumas pessoas olharem para uma cena que estava nascendo”, disse o cantor em entrevista à Billboard Brasil.
As tretas de Raffa Moreira
Lá em 2017, a grande referência do cantor era a cena de trap dos Estados Unidos, que já tinha uma base de fãs considerável no país. Ele simplesmente adaptou o estilo para o Brasil, incluindo as tretas de artistas, algo que é presente na cultura há anos.
No entanto, se Raffa hoje se orgulha do impacto de suas primeira letras, o mesmo ele não pode dizer das brigas compradas no início da carreira.
Para o cantor, as confusões em que ele se envolveu atingiram um nível além do aceitável. O caso mais grave envolveu o rapper Meno Tody, com os dois se atacando na internet e a fazendo referências de facções criminosas.
Além disso, em 2019, Raffa chegou a sacar uma pistola durante uma apresentação em São Paulo.
“Tem assunto que não pode ser comentado, entendeu? Não tem necessidade de você apontar arma, por exemplo. Meus advogados até hoje têm que monitorar questões legais, é uma coisa que pode gerar até problema na rua mesmo”.
O que achamos de Raffa Moreira?
Produtores e artistas ouvidos pela Billboard Brasil sobre a importância de Raffa apontam que o rapper foi peça importante na construção na cena de trap brasileira e seu talento foi subestimado, principalmente pelo público.
Um episódio que reflete essa importância foi a participação do cantor no projeto “Poetas do Topo 2”. Em entrevista ao podcast “rap, falando”, o cantor e produtor FBC, que esteve presente na música, explicou a história.
“O beat [da música] era de um jeito, o pessoal mandava um só flow, e quando o Raffa Moreira gravou, todo mundo pegou o celular para reescrever [a letra]. Todo mundo mudou o flow. Era um beat de boombap e o Raffa fez virar trap”, contou.
A história virou uma espécie de referência de como, dentro da cena do rap, Raffa era visto como um nome à frente no seu tempo. Só que as brigas de internet podem ter até ter servido para gerar engajamento, mas refletiram na imagem do cantor.
“A longo prazo, as tretas me atrapalharam. A curto prazo, era o necessário. É uma forma de você gritar para o mundo te ouvir”.
Desculpas no balcão
O tempo passou e Raffa Moreira sofreu calado. Nos últimos anos, vimos o cantor fazer as pazes e até gravar uma parceria com Matuê, “Beleza Exótica” – um feat. com Meno Tody também estava programado, mas acabou ficando de fora do trabalho.
O MC não mostra muito arrependimento com o seu passado, pois acredita que essa construção foi importante para trazer popularidade para ele e para a cena do trap.
Nas redes sociais, algumas pessoas já até foram pedir desculpas a Raffa pelas críticas do passado. A fila não é grande, mas como dizem os jovens, o muro está baixo para quem quer levantar a mão e dizer que é fã do cantor há anos.
“As pessoas compreendem melhor a proposta do artista de trap hoje e acho muito legal ver nomes como Veigh, Kayblack e Vulgo FK tendo o destaque que têm. Quando eu comecei, nunca que ia ter um festival, mano, mal tinha show de rap, né? Hoje tem casa de show, festival, as marcas estão abraçando. Sinto que ajudei a abrir esse espaço”.
Me desculpa Raffa Moreira, eu era jovem demais pra compreender a revolução que você iniciava
— andshoow (@AndsonRodriguez) February 11, 2023