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Noel e Liam Gallagher, do Oasis, tiveram o mundo aos seus pés. E estragaram tudo

Noel e Liam Gallagher, do Oasis, tiveram o mundo aos seus pés. E estragaram tudo

Ascensão do grupo coincide com efervescência política e cultural do Reino Unido

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Reunião do Oasis: Os irmãos Noel e Liam Gallagher, do Oasis (Reuters)

Numa entrevista que fiz com Robbie Williams, no início dos anos 2000, perguntei a ele sobre Oasis, que acaba de anunciar o retorno após 15 anos. O cantor e os irmãos Liam e Noel Gallagher simplesmente se detestam, mas ainda assim o autor de “Millennium” soltou um pequeno desabafo. “Eles tinham o mundo aos seus pés e simplesmente jogaram tudo fora.” Williams, na verdade, soltou um palavrão cabeludo em vez do “jogaram tudo fora”, mas não importa. O Oasis foi a banda mais importante do final do século 20, mas sucumbiu às brigas e picuinhas dos irmãos.

Melhor banda do final do século 20? Sim, melhor banda do final do século 20. Primeiro, pela qualidade das canções. O Oasis tem pelo menos dois discos que podem ser considerados clássicos: são eles “Definitely Maybe”, de 1994 (que deverá ganhar uma reedição especial no dia 30 de agosto, quando completa 30 anos, véspera da da venda dos ingressos) e “(What’s the Story) Morning Glory”, de 1995.  Em ambos, eles não apenas exibem a propalada influência de Beatles –copiaram na cara dura, bem como o riff de “Cigarettes & Alcohol” foi tirado de “Bang a Gong (Get it On)”, do T. Rex–, mas atualizam o  “som de Manchester”, surgido na segunda metade dos anos 1980.

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Explicando melhor: na virada dos anos 1980 para 1990 surgiu uma vertente do rock de Manchester que fazia um cruzamento entre rock e música eletrônica. Batizado de “Madchester” por Tony Wilson, empresário que descobriu, entre outros, o Joy Division e o Happy Mondays, o movimento tinha, entre outros representantes, Inspiral Carpets, The Charlatans U.K. e Stone Roses.

O Oasis, também de Manchester, atualizou os elementos em sua música e comportamento (Liam surrupiou o movimento de palco e a marra de Ian Brown, vocalista dos Stone Roses), e privilegiou o lado rock e as canções mais palatáveis –cortesia de Noel, melodista de primeira.

A ascensão do Oasis coincide ainda com um momento de euforia na política e nas artes do Reino Unido. Que tinha acabado de colocar no cargo de Primeiro Ministro um político do Partido Trabalhista –Tony Blair, de discurso e atitudes modernas e fã de rock. A onda de otimismo foi chamada de Cool Britannia e gerou uma leva de novas e criativas bandas de rock –Oasis, Blur, Suede , Pulp e Elastica, entre outras, que criaram o movimento britpop. Além das Spice Girls no pop, Goldie no drum’n’bass, fenômenos do cinema (a comédia “Quatro Casamentos e um Funeral”, por exemplo) e novos talentos na moda e nas artes visuais.

Nesse sentido, o Cool Britannia foi maior do que, por exemplo, o punk rock. O seu impacto é semelhante ao da Swinging London, que nos anos 1960 exportou para o mundo a psicodelia, os Beatles, The Who e Rolling Stones e os filmes de James Bond, além da minissaia da estilista Mary Quant.

Mas, afinal, por que o Oasis teve o mundo nas mãos? Simples. Com raríssimas exceções, nem sempre um artista que faz sucesso no Reino Unido consegue conquistar o mercado norte-americano, a Meca da indústria musical. É o caso do próprio Robbie Williams, fenômeno do Reino Unido, mas cuja atitude era considerada zombeteira demais para atingir as adolescentes dos Estados Unidos.

O Oasis, contudo, tinha composições de qualidade, visual e aquela empáfia do típico astro de rock (Noel Gallagher, por exemplo, ao ouvir do vocalista do Maroon 5 que havia montado uma banda por causa do Oasis, simplesmente disse: “Se eu soubesse que meu grupo resultaria em porcarias como você, jamais teria criado o Oasis!”) e boa colocação nas paradas.

Liam e Noel Gallagher falharam ainda no quesito fundamental para cair nas graças do Novo Mundo: a qualidade de suas apresentações. A postura “não estou nem aí” e as eternas discussões em cima do palco –fora a atitude de Liam, que num acústico da MTV alegou estar com dor de garganta e não apareceu para cantar– implodiram a carreira do quinteto britânico. Com a derrocada, o Oasis impediu que seus companheiros de geração pudessem pegar carona no sucesso e fazer a América.

Noel e Liam Gallagher não repetiram na carreira solo o sucesso que tiveram com o Oasis –embora os discos sejam de uma qualidade incontestável. Nesse quesito, Liam foi mais provocador: este ano ele soltou um disco em parceria com John Squire, ex-guitarrista dos… Stone Roses. O retorno dos irmãos aos palcos, com certeza, não trará o Cool Britannia de volta. Mas certamente nos fará lembrar de como o mundo um dia poderia ter estado aos seus pés. 

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