
No próximo sábado (28), o IMS Paulista, em São Paulo, inaugura a exposição “Pequenas Áfricas: o Rio que o samba inventou”. A exposição reconstitui a cena cultural carioca, a partir do começo do século 20, na qual as comunidades afrodescendentes criaram o samba urbano.
A mostra aborda as complexas redes de trabalho, solidariedade e espiritualidade construídas nesse período histórico, além de suas reverberações no presente, das escolas de samba aos terreiros e quintais.
A curadoria da exposição é dos historiadores e professores Angélica Ferrarez, Luiz Antonio Simas, Vinícius Natal e Ynaê Lopes dos Santos. A expografia é assinada pela arquiteta Gabriela de Matos.
Na adia da abertura, às 11h, haverá uma roda de samba conduzida pelo bloco Cacique de Ramos, cuja história está contemplada na exposição. O evento é gratuito e aberto ao público.
Dividida em dois andares, a exposição reúne aproximadamente 380 itens, entre documentos, gravações musicais, fotografias, matérias de jornais, filmes e obras de arte, provenientes do acervo do IMS e de outras instituições.

Os Oito Batutas: Jacó Palmieri, Donga, José Alves, Nelson Alves, Raul Palmieri, Luís de Oliveira, China e Pixinguinha, 1919 (Autoria não identificada. Coleção José Ramos Tinhorão/Acervo IMS)
Exposição
O primeiro andar da mostra adota um viés histórico, apresentando a região onde o samba urbano se originou e suas mudanças ao longo do tempo.
O percurso se inicia no Cais do Valongo. Tido como o maior porto escravista da história, o complexo do cais recebeu cerca de 1 milhão de africanos escravizados, vindos forçados para o Rio de Janeiro.
Inteiramente aterrado nas reformas urbanísticas do início do século 20, foi redescoberto durante escavações em 2011 e reconhecido pela Unesco como Patrimônio da Humanidade em 2017.
O núcleo seguinte, por sua vez, tem como pano de fundo o contexto da República e seus esforços de embranquecimento, quando o governo estimula a imigração europeia, expulsando as populações afrodescentes do centro e criando leis de criminalização de manifestações da cultura popular, como a prática da capoeira.
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Neste segmento, a exposição reúne imagens e documentos da Praça Onze, principal local da Pequena África histórica, habitado, no começo do século 20, por uma expressiva população afrodescendente e também por imigrantes judeus, italianos e ciganos.
Foi bem perto dali que se fundou a primeira escola de samba e, em torno dela, realizou-se o primeiro desfile das agremiações. Em 1944, foi derrubada para a construção da avenida Presidente Vargas.
A partir da década de 1930, compor, tocar e cantar samba deixou de ser delito para se tornar profissão.
A mostra destaca figuras essenciais nessa história, como Donga, Pixinguinha, Heitor dos Prazeres, Clementina de Jesus, João da Baiana, Cartola, entre tantas outras.
São exibidos documentos e itens como o violão de Donga, a partitura de “Pelo telefone”, considerado o primeiro samba gravado do Brasil, o passaporte e o contrato de Pixinguinha com a gravadora Victor, registros e reportagens sobre a turnê feita pelos Oito Batutas em Paris em 1922, além de pinturas de autoria de Heitor dos Prazeres.

Sem título, da série Casa de bamba, 2004. Na imagem, Tia Doca. (Bruno Veiga / Coleção do artista)
As Tias do samba
A exposição também evidencia a atuação central das Tias na construção do universo do samba. Mulheres negras e mais velhas em sua maioria, a primeira geração de Tias chegou ao Rio de Janeiro em meados do século 19 provinda da Bahia.
Eram rezadeiras, cozinheiras e quituteiras que exerciam papéis de liderança em suas comunidades. Com o passar das gerações, tornaram-se cada vez mais ligadas às escolas de samba.
A partir de fotografias, livros, reportagens e depoimentos, a exposição trata da trajetória de nomes centrais, como Tia Ciata, Tia Amélia, Tia Dodô e Tia Lúcia.
O segundo andar da mostra, por sua vez, é focado nas práticas cotidianas, revelando como as redes de sociabilidade criadas no universo do samba no começo do século 20 reverberam na atualidade.
Entre os destaques, está o núcleo que reúne objetos guardados nas casas de Tias e sambistas, como Djalma Sabiá, Dona Ivone Lara e Tia Maria do Jongo.
São discos de vinil, máquinas de escrever, medalhas, imagens de santos e orixás, partituras e receitas, entre muitos itens de valor histórico e afetivo.
Guardados em armários ou pendurados nas paredes das casas, revelam histórias muitas vezes pouco lembradas, além dos esforços de preservação da memória pelas próprias comunidades.
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Agremiações
Outra faceta importante é o nascimento das escolas de samba, na década de 1920, nos subúrbios do Rio.
A partir de diferentes materiais, a seleção reforça que, desde o princípio, as escolas são lugares associados à luta por direitos e cidadania da comunidade negra, funcionando como uma poderosa estratégia de pressão social e disputa por poder.
A seleção também relembra a experiência do bloco Cacique de Ramos, fundado em 1961 por um grupo de jovens moradores dos subúrbios da Leopoldina.
Ali nasceu o Fundo de Quintal, grupo que revolucionou o samba no final da década de 1970, dando-lhe a feição de pagode.
No final do percurso, o público encontra um grande painel que mostra as conexões entre artistas de diferentes gerações, no qual é possível escutar canções e depoimentos.
Serviço – “Pequenas Áfricas: o samba que o Rio inventou”
Inauguração: sábado (28 de outubro)
Visitação: até 21 de abril de 2024
Endereço: IMS Paulista, 7º e 8º andar | Entrada gratuita (Av. Paulista, 2424 – Bela Vista, São Paulo – SP, 01310-300)
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