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Djavan fala sobre racismo de gravadoras e reclama de samples: ‘Trabalho danado’

Djavan fala sobre racismo de gravadoras e reclama de samples: ‘Trabalho danado’

Alagoano disse que se envolve 'mais do que gostaria' em processos de liberação

Quando Djavan ouve a pergunta que elenca diversas críticas que sofreu de ouvintes, críticas e diretores artísticos, ele mesmo completa o questionamento: “Houve de tudo. Você está falando de racismo, né?”. Lançando “Improviso”, o alagoano conversou com a Billboard Brasil sobre o tema que engloba pressão das gravadoras e público. Ele também falou sobre o processo “chato” de liberação de samples.

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“Eu sempre disse ‘não’ a todo tipo de intervenção. Sempre. A começar pelas gravadoras. Eu brigava. E eu sou uma pessoa ruim quando eu quero. Tem um ditado muito bom: ‘Quando eu sou bom, sou bom. Mas quando sou ruim, eu sou péssimo’. Porque eu defendo com unhas e dentes meu pensamento. Com as gravadoras eu sempre fui péssimo”, inicia em entrevista concedida no prédio da Sony Music Brasil, responsável pela distribuição deste que é o 26º disco de estúdio, lançado pelo selo do cantor, Luanda Records.

Grande parte da discografia do compositor foi lançada pelas gravadoras CBS e Epic, ambas hoje propriedades da própria Sony Music.

‘O fato de ser negro’

“Eles queriam mudar meu nome, no começo. ‘Djavan’ era horrível, não dava. Queriam mudar meu jeito de fazer música. Diziam que eu tinha talento, mas era ‘complicado’. Pediam para fazer coisa simples, dois versos e refrão e já foi. Perguntavam se eu não queria ficar rico. Eu dizia ‘não, quero fazer o que eu quero, o que desejo’. Tive que brigar o tempo todo para me impor. Vinha um preconceito antes. O fato de ser negro, você não sabe… É terrível. O que você tem de brigar por causa disso… Eu fui preso em São Paulo por ser negro”, diz relembrando prisão na Praça da Sé, em São Paulo, quando visitava uma loja de pianos no final dos anos 1970.

“Eu sou um artista negro que não obedeço os trâmites normais de uma carreira. Eu não tenho diploma de faculdade. Então, as pessoas começaram a dizer que eu era ‘nonsense’. Como um homem negro, filho de uma lavadeira, advindo do segundo Estado mais pobre da federação pode ter algo a dizer que me interesse? Não pode. Como é que se acredita em algo que estava dizendo? Era nítido que as pessoas não acreditavam. Mas Deus me deu força de leão para que eu brigar pela minha arte. Eu não vergo. Eu não cedo”, finaliza.

O ‘trabalho danado’ de liberação de samples

Apesar de popularíssimo entre rappers e produtores de R&B, Djavan contabiliza poucos samples espalhados pela música. O site Who Sampled contabiliza por volta de 30 canções do alagoano utilizadas em outros fonogramas. Ele discorda. “Engraçado você dizer isso”, ele contesta. “Eu acho que a minha obra está muito sampleada. Não acontece nada com a minha obra que não passe por mim. O mundo inteiro sampleia minha música. Aqui no Brasil, a coisa tomou um volume… Diariamente, eu sou obrigado a me debruçar em cinco projetos dos outros”, explica. Canções como “Vida”, do rapper Matéria Prima, por exemplo, segue fora das plataformas por falta de liberação.

Questionado se costuma aprovar ou negar pedidos de liberação, ele diz: ‘Muito mais ‘não’ do que ‘sim’”. E justifica: “Porque o zelo que eu tenho advém de a música já ser diferente, distinta. Se eu permito uma leitura equivocada, é um prejuízo para mim. Como eu sei que minha música é inusual, eu tenho que ter esse trabalho de selecionar o que realmente corresponde à realidade da música. É muito difícil [dizer não]. Dizer sim é fácil, você não pensa. Mas o ‘não’ você precisa justificar. As pessoas têm trabalho com aquilo. Eu sou muito acessado pelos músicos jovens, até mais do que eu gostaria, porque me dá um trabalho danado”, explica.

E eu tenho maior pena de dizer não. Só quando é muito ruim que eu digo um ‘não!’ [mais taxativo]

Há alguns anos no trap, rap e R&B de pegada mais romântica, o nome de Djavan voltou a ganhar destaque. Em 2019, o rapper paulista Santiago gravou “Flow Djavan”, referência aos versos “BK flow Zidane/E os inimigos que se danem” do rapper BK’. Em 2025, então, o próprio Abebe Bikila sampleou “Esquinas” de Djavan para compôr “Só Eu Sei”, do álbum “Diamantes, Lágrimas E Rostos Para Esquecer”). Quem caiu na malha fina do cantor foi Luccas Carlos, que gravou “DJAVAN” sem samples para o álbum “Dois”, de 2024. Artistas como Racionais MC’s, Emicida e DJ Hum já se utilizaram de canções do compositor.

Em novembro de 2011, o rapper Matuê contou à Billboard Brasil como foi pedir liberação de uma versão pouco comum do hit “Oceano”. O rapper cearense queria adicioná-la ao álbum “333”, lançado pouco depois naquele mesmo ano. Segundo ele, a batalha —que terminou bem sucedida— não foi fácil. “Preparamos tudo muito bonitinho para mostrar a ele. Chamei meu advogado, mostrei o projeto do álbum”. O receio do rapper tinha nome: a canção que usaria o sample se chamava “Crack Com Mussilon” —o single tornou-se a mais ouvida daquele ano no Billboard Brasil Hot 100

“[Quando recebemos a notícia] Foi uma gritaria e um dos dias mais felizes da minha vida!”, contou Matuê.

‘Improviso’ e turnê ‘Djavanear’

“Improviso” conta com 12 faixas e homenagens a Gal Costa (1945-2022) e Michael Jackson (1958-2009) e antecede turnê “Djavanear” que celebra 50 anos de carreira.

Em entrevista à Billboard Brasil, ele também comentou a imperativa “Falta Ralar!” na qual desenha uma comparação entre as maturidades femininas e masculinas na adolescência. “Eu tenho um filho de 18 anos, o mais novo”, diz o pai de outros quatro e também avô de três netos.

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