OPINIÃO: Cancelado, Primavera Sound São Paulo errou no formato
Edição 2024 aconteceria no fim de novembro e começo de dezembro
A esta altura, todo mundo sabe que, na América Latina, o Primavera Sound 2024 foi cancelado. Como profissional da música e fã da marca Primavera Sound, cuja edição original, em Barcelona, e o spin-of, no Porto, eu tive a oportunidade de acompanhar, recebo a notícia com pesar.
No fim da tarde da sexta-feira (para o desespero dos colegas da imprensa), a produção do evento comunicou o que vinha sendo especulado há semanas: nem São Paulo, nem Buenos Aires, nem Montevidéu ou mesmo Assunção vão receber o festival esse ano. O Primavera Sound 2024 em São Paulo estava previsto para acontecer nos dias 30 de novembro de 1 de dezembro, no Autódromo de Interlagos. Esta seria a terceira edição no Brasil.
O cancelamento vem a três meses da data marcada para o festival, com ingressos já vendidos (veja aqui como conseguir reembolso). Ou seja, muito em cima da hora. A notícia não surpreendeu, porém: o line up, que a Billboard Brasil apurou que deveria ter sido anunciado há um mês e meio, na semana do dia 15 de julho, jamais saiu, e o anúncio de shows solo dos Smashing Pumpkins, banda mais cotada para ser headliner do Primavera 2024, botou ainda mais lenha na fogueira.
O Primavera Sound na América Latina se junta a outros festivais pelo mundo, que vêm lutando contra os altos preços de equipamentos e logística –motivo que, só nesta semana, provocou o cancelamento do Weehoo, no Recife, e do Desert Daze, na Califórnia. O preço do deslocamento entre países da América Latina é muito superior do que se pratica na Europa, onde o custo de vida é comparativamente mais baixo e o poder de compra mais alto.
Por que o Primavera Sound 2024 foi cancelado?
Mas aqui no país houve, também, um outro erro de cálculo da produção, que acabou influenciando nos principais problemas enfrentados pelo festival na América Latina. Talvez pelo gigantismo do nosso país, de proporções continentais, optou-se por um megafestival –que embora tivesse metade da capacidade do Rock in Rio, Lollapalooza e do novato The Town–, acontecia em formato parecido: palcos enormes, que exigiam headliners robustos e muitas atrações para rechear o line up.
Foi o que tornou o festival inviável. A necessidade de atrações de peso para encabeçar o cartaz –ainda mais numa época em que bandas de arena voltadas para o público alternativo estão minguadas– colocou o festival em uma armadilha criada por ele mesmo. Talvez sonhando alto com o oba-oba de shows e festivais no Brasil pós-pandemia, o Primavera Sound São Paulo parece ter mirado na edição original, de Barcelona, quando, na verdade, deveria ter olhado para versões menores de si mesmo.
O Nos Primavera Sound, que acontece anualmente no Porto, em Portugal, é um exemplo que poderia ter sido seguido com mais sucesso e menos entraves no Brasil. Até a edição de 2023, a perna lusitana do evento era realizada para menos de 30 mil pessoas por dia, em um ambiente agradabilíssimo, onde é possível assistir (e ouvir) bem aos shows sentados numa colina – o que os indies velhos, público alvo do evento, agradecem. A conta é simples: festivais menores exigem estrutura menores.
Era mais provável que eu e tantos outros não estivéssemos aqui lamentando o cancelamento do Primavera Sound 2024 São Paulo 2024 se o festival tivesse fugido do leilão por grandes atrações, cada vez mais acirrado, apostando em nomes de médio porte, do tipo que agrada o público alvo do evento –um público que também vai a festivais para descobrir bandas e não só acompanhar o que já gosta, como acontece com os já citados megafestivais brasileiros.
Nos resta torcer para que o Primavera Sound avalie melhor o cenário local e reveja suas estruturas, para que possamos voltar desfrutar de um dos festivais mais interessantes do mundo já em 2025.
