Laura Pausini usa batidas dançantes para falar de despedidas
"Ciao" foi incluído na celebração dos 30 anos de carreira da cantora italiana
No universo do jornalismo musical, quando a conversa é boa, você geralmente pergunta ao entrevistado algo além da música que ele está trabalhando. No caso de Laura Pausini, uma das maiores expressões da música pop italiana nas últimas três décadas, a resenha termina com um “estou esperando aquele disco de canções do Lucio Battisti!” – um ícone da música romântica italiana dos anos 1970.
O pedido, feito nos últimos minutos da entrevista, rende uma declaração apaixonada. “Você me faz ter pensamentos elevados ao falar desse nome. Lucio Battisti praticamente inventou a música pop italiana”, derrete-se. Mas é tempo de falar de “Ciao”, mais recente single da cantora italiana, e que chegou hoje às plataformas de streaming. Uma composição de Sam Smith, Frasier T. Smith, Paolo Carta, Laura Pausini, Antonio di Martino e Anice, ela chega em duas versões –é cantada em italiano e em espanhol– e será agregada ao repertório de “Almas Paralelas/Anime Parallele”, disco no qual Laura comemora 30 anos de carreira.
“A minha ideia era terminar a minha turnê atual e depois ver o que faz. Mas Sam apresentou essa canção e decidi incluí-la no meu repertório”, diz Laura. O projeto inclui ainda as canções “Nemica” e “All’amore Nostro” e “Ti Porterai Lontano”.
“Cia” tem uma batida envolvente, que lembra as produções do pop inglês contemporâneo. A letra, segundo a própria Laura, fala do ato de se despedir –seja de alguém ou de um relacionamento– de modo pacífico. É sobre deixar ir pacificamente uma pessoa importante em nossas vidas. Deixar ir e viver a nossa vida, respeitando o outro”, diz Laura, que em 2023 se despediu de uma grande amiga.
A explicação permite a este repórter traçar um paralelo entre “Chiao” e “Francesca (Piccola Aliena)”, que também foi feita para uma pessoa próxima a Laura, e que morreu precocemente. A canção alivia as dores da cantora? “É uma função importante da música”, diz ela.
Laura prossegue. “Quando eu era menina, eu usava as canções para poder chorar. E foi a partir desses momentos que me apaixonei pela música brasileira”, confessa. Laura conta que acompanhava o pai, pianista, em seus périplos pela noite. “Ele tocava de tudo. Mas a bossa nova fazia com que eu me sentisse melhor depois de tanto choro.”
O novo single de Laura Pausini chega acompanhado por um videoclipe estiloso, no qual ela surge loira –um crime para quem admira os cabelos negros como a asa da graúna. “Eu tinha de surgir loira para interpretar alguém que passasse por um processo de perda e separação”, explica. “E mesmo no vídeo, você nota que as bailarinas estão inicialmente de véu, que significa a impossibilidade de ser livre. Minutos depois, esse véu desaparece, mostrando a mudança.”
Laura Pausini é, na visão desse crítico, um dos nomes mais importantes da música italiana das últimas três décadas. A cantora romântica do início de carreira (lembrem-se de “La Solitudine”, que Renato Russo veio a regravar) ganhou força de interpretação e agregou outros elementos musicais em seu repertório. “Não me acho a mais importante, mas sinto a falta de mais nomes femininos. E elas estão por aqui, precisam ser descobertas”, desabafa. Laura indica Madame, uma compositora e intérprete que incrementa o cancioneiro local com boas doses de R&B e trap. “Escute ‘Voce'”, indica.
A conversa termina com um apelo carinhoso. “Faz seis anos desde a nossa última entrevista. Vê se não some por tanto tempo”, brinca. Depois dessa, dá até para sonhar com o disco em tributo a Lucio Battisti. Mas “Chiao” é um belo trabalho de uma cantora em constante movimentação.