‘Faltou humanidade’: Taylor Swift e o gerenciamento de crise dos artistas
Billboard Brasil ouviu especialistas sobre as consequências da morte de fã
Ana Clara Benevides morreu na noite de sexta-feira (17) durante o primeiro show de Taylor Swift no estádio do Engenhão, no Rio de Janeiro. A passagem da “The Eras Tour”, da loirinha, pelo Brasil é produzida pela T4F, empresa responsável por festivais como o Primavera Sound e Turá.
Por volta das 3h do dia seguinte, a cantora postou uma nota no Instagram, lamentando a morte da fã, mas sem citar seu nome. Às 8h51, a T4F também publicou um comunicado lamentando a morte de Ana Clara.
Tanto o posicionamento de Taylor, que disse que não homenagearia a fã morta em seus shows, quanto a da T4F, que não prestou assistência à família, foram duramente criticados nas redes sociais.
Mas as críticas não ficam restritas aos fãs. Profissionais de relações públicas acostumados a lidar com gerenciamento de crises apontam uma série de erros na forma como artista e produtora vêm conduzindo a questão.
“Nunca podemos esquecer que o artista também é uma marca, que precisa zelar pela sua reputação. Mas é evidente que faltou humanidade para Taylor”, diz uma profissional que trabalhou com artistas do universo sertanejo e empresas multinacionais.
Parte dos profissionais ouvidos pela Billboard Brasil preferiu falar em condição de anonimato para não se prejudicarem em futuros trabalhos.
Transparência em primeiro lugar
Cristina Grillo trabalhou por 30 anos em grandes redações pelo Brasil e, desde 2016, atual como relações públicas no mundo corporativo. A profissional aponta uma lição número um para um gerenciamento de crise efetivo: transparência.
“Há uma ideia de que ocultar algumas informações vai ajudar em algo. Pelo contrário. É fundamental ser transparente, jogar limpo, preservando sua imagem e integridade.”
Outro ponto destacado por Cristina é a prevenção. “É fundamental que trabalhemos como o setor de ‘vai dar merda’, avaliando possíveis riscos antes que eles se tornem reais.”
No dia da morte de Ana Clara Benevides, era sabido que o Rio de Janeiro registraria altas temperaturas, e mesmo assim a produtora não só tentou mitigar os efeitos do calor, como espalhou tapumes pelo Engenhão, bloqueando a entrada de ar.
O que a T4F fez de errado
Na sexta-feira, a sensação térmica no Rio de Janeiro chegou na casa dos 60º C. Para os fãs de Taylor que foram ao estádio Nilton Santos, a situação se agravou por três decisões da T4F: a empresa proibiu a entrada no local com garrafas de água, colocou tapumes ao redor do estádio e instalou placas de metal sobre o gramado. Tudo isso tornou o local ainda mais quente.
“Tomar essas medidas sem uma comunicação clara gerou um entendimento de que a busca era pelo lucro máximo”, disse uma das fontes ouvidas pela reportagem.
Houve quem justificasse que as atitudes da cantora e da produtora posteriores à tragédia tenham se dado por questões judiciais. Mas o importante é manter uma interlocução clara com o público.
“Quando você não fala vão falar por você. Claro que, por exemplo, toda e qualquer palavra pode ter uma consequência jurídica e legal. Mas explicar medidas tomadas de prevenção pode gerar até certa empatia”, diz um profissional de PR.
O que Taylor fez de errado
Foi consenso entre os profissionais ouvidos pela Billboard Brasil que faltou tato da cantora com seu público, sempre tão apaixonado. Seu único comentário sobre a tragédia foi feito nos stories do Instagram, sem citar o nome de Ana Clara, e usando uma fonte que imitava caligrafia, destoando da própria persona construída por Taylor.
Bom deixar claro: Taylor Swift é uma agente central na discussão sobre as decisões sobre sua carreira. Quem trabalha com relações públicas acredita não ter a menor possibilidade de toda e qualquer ação sobre o caso ter passado pela aprovação da cantora.
“Me pareceu um grande erro uma cantora tão identificada com seu público, alguém que passe essa imagem de proximidade, ter uma postura tão distante, tão pouco empática”, disse outra fonte.
Para além da questão jurídica, que também é fundamental, pesou a questão geográfica. O Brasil não é um mercado central para a carreira da cantora –ou pelo menos, é essa mensagem que ela deixou transparecer ao não homenagear Ana Clara nos shows, adiar a segunda data a poucas horas do início do show, quando o estádio já estava lotado, e a falta de contato e assistência à família da vítima.
“Após o caso, vimos a equipe de Taylor trabalhar fortemente para emplacar matérias em veículos internacionais que não tinham a menor relação com o caso no Brasil. E deu muito certo. Com o público brasileiro, ficou muito a imagem de descaso com a morte de uma fã. Mas, para o resto do mundo, ficou a sensação de uma Taylor traumatizada e que fez tudo ao seu alcance”.