Fã de Sandy, Chico Buarque e amigo carinhoso: o Sabotage que você não conhece
Rapper morreu aos 29 anos, assassinado em São Paulo, em janeiro de 2003
Sabotage, que teria feito 51 anos no último dia 3, foi um dos maiores nomes do rap brasileiro. Suas rimas influenciam a cena até hoje: abordavam as questões sociais, denunciavam o racismo, a violência e as dificuldades da comunidade do Canão, no Brooklin, Zona Sul de São Paulo.
A imagem de Sabotage que ficou eternizada mostra o rapper sério, fazendo carão, e não traduzem o pai e amigo carinhoso que ele era nos bastidores.
“Ele era muito engraçado. Ficava dançando na frente do espelho, fazendo caretas, passos, gestos. Tudo o que ele fazia no palco era ensaiado”, conta a filha do rapper, Tamires Rocha, que tem a mesma idade do pai quando foi assassinado com quatro tiros na véspera do aniversário da São Paulo que fez dele ícone, em 2003.
“Meu pai era muito artista. Ele comia gengibre puro, porque falava que era bom para a voz e colocava pasta de dente no rosto para as espinhas. Imagina! Aquele homem preto cheio de pasta na cara [risos]. A gente ria demais, era muito legal”, lembra.
Wanderson Mateus dos Santos (conhecido como Sabotinha), de 31 anos, recebia conselhos de Maurinho (como Sabotage era chamado na intimidade) com frequência. “Ele ia às reuniões na escola, me buscava. A gente andava na rua e às vezes ele falava um bolão [reclamação] para mim. Sempre foi muito presente”, diz.
Eclético, mesmo!
No dia a dia com a família, o rapper colocava para tocar em casa Chico Buarque, Pixinguinha, Eminem, Linkin Park, Ivete Sangalo e até Sandy & Junior. Ele usava rádios e TVs para rimar em cima de batidas e músicas diversas, escrevendo as melhores ideias e praticando incansavelmente.
“Sabotage era fora da curva comparado com a maioria da cena do rap nacional, que era extremamente fechado e dentro do rap de São Paulo, que ainda era bem gangsta“, lembra o produtor musical Zegon, que produziu o álbum “Rap É Compromisso”, único que Sabotage teve tempo de lançar em vida.
“Ele teve essa vivência [da quebrada], mas curtia drum n’ bass, rock, eletrônica, o que fosse… Acho que ele tinha um crush na Sandy [risos]. Sabotage era totalmente livre e isso refletiu muito na musicalidade dele”, acrescenta o DJ, que, ao lado de Tejo Damasceno, foi responsável pela produção de “Sabotage 50” –o álbum em homenagem ao aniversário de Mauro Mateus dos Santos, lançado no início do mês (ouça abaixo).
“Ligado no 220V”, como definem os amigos, Sabotage também tinha facilidade para dormir em qualquer lugar. “Ao mesmo tempo que ele vinha de uma agitação insana, ele parava de falar de repente e no mesmo segundo estava capotado”, diz Tejo. “Ele estava no estúdio, falando com você e a voz dele sumia. Em um segundo, ele dormia.”
Um lado do rapper com o qual os mais próximos a ele tiveram o privilégio de conviver foi o de amigo carinhoso. “Quando ele estava muito feliz, ele te abraçava. Ficava segurando e falava: ‘Não vou largar’. Ele não soltava mesmo, tinha que brigar. Era tipo jiu-jitsu! Ficava falando que ia beijar. Vinha e dava um beijo de carinho”, conta Zegon.
“Em 2024, isso é normal, mas em 1999, no rap, não era nada normal um homem abraçar outro homem e dizer que ia te beijar com carinho, ter demonstração de afeto. A cabeça dele já era diferente, ele era tranquilo”, completa Tejo.