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Dudu Nobre: ‘Samba-enredo não dá dinheiro, dá dor de cabeça. E satisfação, nome…

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Dudu Nobre: ‘Samba-enredo não dá dinheiro, dá dor de cabeça. E satisfação, nome…

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Quando soprar as velas do bolo de aniversário no próximo dia 6 de novembro, Dudu Nobre poderá dizer que completou cinco décadas de sucesso. Nascido em família de bambas, já tocava instrumentos antes dos 6 anos. Aos 10, já tinha um samba testado no desfile infantil da Marquês de Sapucaí. Passou a infância com Jovelina –a Pérola Negra– e Nelson Cavaquinho na sala de casa, e na juventude tocou com Almir Guineto e Zeca Pagodinho. Estourou em 1997, quando compôs “Posso Até Me Apaixonar” para o sambista de Xerém, que vendeu 600 mil cópias naquele ano.

Dois anos depois, partiu em carreira solo, gravou 15 discos com incontáveis sucessos. Desde então, se firmou como um dos expoentes do samba neste novo milênio. Em entrevista à Billboard Brasil, Carlos Eduardo de Salles Nobre celebrou a chegada dos 50 anos, repassou a carreira em revista, refletiu sobre os rumos do Carnaval e imaginou como seria a vida se continuasse na faculdade de Direito.

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Billboard Brasil: Você completa 50 anos em novembro de 2023. Desses 50, já se passaram 24 anos desde seu primeiro disco. Que balanço você faz desse meio século?

Dudu Nobre: Eu comecei a trabalhar com música –e falo de quando você começa a ganhar o seu dinheirinho– com 10 anos. Foi quando tive o meu primeiro samba na Marquês de Sapucaí. Já são 40 anos trabalhando e 24 como cantor de samba. Nunca imaginei ir tão longe, ter 15 discos e mais de 300 músicas gravadas, 40 sambas-enredo para os mais diversos Carnavais. Voltei a fazer samba-enredo há dez anos, nesse tempo ganhei as disputas em metade das escolas do grupo especial do Rio de Janeiro. É muito gratificante continuar essa história, logicamente muito mais experiente. Escuto os meus primeiros discos e não me arrependo de nada, isso é bem gratificante.

O samba do Salgueiro para 2024 vem sendo um dos mais elogiados neste pré-Carnaval e aborda a causa indígena. Você participou da parceria como um dos compositores. Como foi o processo criativo?

O processo de composição de samba-enredo é muito engraçado porque é muita gente. Geralmente marco lá em casa, a gente faz uma comida, pega uma bebida, aquela coisinha. Um dia chegou tanta gente que eu perguntei: “Todo mundo aqui está no samba?”. Esse samba fala dos Yanomamis, dos povos originários. Um enredo muito necessário, até pelo momento que a gente vive. Salvo engano, esse ano foram 20 eliminatórias no Salgueiro. Já no primeiro momento esse samba arrebatou de tal maneira… Já é um samba-enredo que começa a ser comentado fora da bolha do Carnaval. Eu canto o refrão no meu show e o pessoal conhece. A função de um samba-enredo é essa, quando você consegue um samba que aparentemente vai virar um hino de uma causa é muito bacana. Ele diz assim:

“Você quer me ouvir cantar em Yanomami pra postar no seu perfil/ Entre aspas e negrito, o meu choro, o meu grito, nem a pau Brasil/ Antes da sua bandeira, meu vermelho deu o tom/ Somos parte de quem parte, feito Bruno e Dom/ Kopenawas pela terra, nessa guerra sem um cesso/ Não queremos sua ‘ordem’, nem o seu ‘progresso'”. É uma coisa muito forte acabar a disputa de samba e ouvir “muito obrigado” do Davi Kopenawa.

O samba tem nove compositores, entre eles Arlindinho Cruz. Dizem que as disputas estão ficando mais caras, com cada vez grupos mais numerosos de compositores defendendo os sambas. Como você enxerga esse processo?

Às vezes você tem um grande samba, mas um bom cantor vai te cobrar R$ 1,5 mil para cantar dez minutos, e um palco no nível desse cantor custa R$ 4 mil ou R$ 5 mil por semana. Se você estiver nas oito eliminatórias, já gastou R$ 40 mil. Com gravação de alto nível e vídeo são mais R$ 10 mil. A coisa foi tomando essa proporção. Se o cara quer um sucesso no sertanejo, ele procura A, B ou C. Se ele quer um samba-enredo de sucesso, ele vai procurar compositores. Esses compositores têm seus grupos.

Eu, por exemplo, não tenho tempo na agenda para defender o samba, então tem que ter alguém ali no dia. Da mesma forma que a caneta é muito importante, é importante ter um financeiro, a produção. Só de torcida você tem que movimentar 300 pessoas por semana. Você precisa de um investidor. Esse ano aí teve escola que o pessoal gastou R$ 200 mil. Mas qual o retorno? Se a escola for campeã, R$ 500 mil. A última colocada vai pegar R$ 380 mil de direitos de arena. Mas tem escola que pega até 50% desses valores. Resumindo: não dá dinheiro, dá dor de cabeça. Além de satisfação, nome, moral…

Você faz parte de uma família com muitas ligações no mundo do samba. Como foi crescer rodeado da realeza dos bambas?

Dos anos 1970 para cá, os únicos que eu não tive o prazer de conviver foram Candeia e Clara Nunes. De resto, de quem você falar eu lembro. A Clementina de Jesus ia para a minha casa, Nelson Cavaquinho também. Clementina pedia para eu tocar para ela quando eu tinha 5, 6 anos de idade. O Nelson Cavaquinho não usava palheta e tocava com a unha, então tinha uma mão pesada, né. Ele pegava os instrumentos e os músicos ficavam desesperados. Todos que vieram do Cacique de Ramos também me viram criança. Sempre foi muito marcante. Meu pai e minha mãe tinham três rodas de samba no Rio, numa época que existiam, sei lá, umas dez rodas de samba fixas.

Você estudou Direito até o quinto período na UFRJ. Já parou para imaginar como seria a vida do Dr. Dudu Nobre?

Se eu fosse advogado eu tava bem, meu velho. Porque se deixar falar, já era [risos]. Acho que ali no no júri eu ia tirar uma onda. Na verdade eu entrei no Direito por causa dos meus tios. Tenho um tio que hoje é tabelião e tem três cartórios no Paraná. Na verdade, lá em casa todo mundo queria ser artista, né, só que aí a arte era uma coisa complicada.

Meu avô era poeta, mas era economista e foi vice-presidente do Banco Central. Meu pai era engenheiro e poeta. Meu tio, advogado e músico. Outro tio é psicólogo e pintor. Depois, virou um dos líderes do Santo Daime mundial.

A família sempre foi das artes, mas ainda tinha que fazer bonito na academia. Estudei Direito pensando justamente nisso, só que quando a música começou a dar certo, não deu para conciliar. Agora que minha filha entrou na faculdade pensei em voltar. É muito complicado, mas uma hora dessas quero voltar.

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