Morre João Rebello, DJ e diretor de clipes de nomes como Marcelo D2 e Ludmilla
João foi responsável por produções no mainstream e underground da música carioca
O DJ, produtor musical e diretor João Rebello foi morto a tiros em Trancoso, litoral sul da Bahia, nesta quinta-feira (24), aos 45 anos. Em sua carreira, o carioca foi responsável por videoclipes de artistas como Marcelo D2, Ludmilla e de um então novato MC Marechal. João foi alvejado dentro de seu carro e ainda não há informações sobre a autoria e a motivação do assassinato.
Sobrinho do renomado diretor Jorge Fernando e neto da atriz Hilda Rebello, João começou na carreira artística como ator mirim de novelas como “Cambalacho”, “Bebê a Bordo” e “Vamp”, da TV Globo. Na música, comandou o coletivo audiovisual Apavoramento Soundsytem, no Rio de Janeiro, e, mais tarde, passou a assinar como DJ John Woo e também como DJ Vunje, tendo reggae, dub e bass como base de seus sets.
Neste ano, João foi um dos convidados da rádio londrina Rinse FM em que tocou funk carioca, breakbeat e bass. Como produtor musical, João assinou “Não Adianta Correr”, faixa que figurou na coletânea “AMP MTV Electrobreaks”, de 2005.
Parceiro de João na Apavoramento, DJ Nepal resumiu a viagem que ambos fizeram na música carioca. “Era uma pessoa muito especial e generosa, que acolheu muita gente em sua viagem cultural criativa, moldando uma peculiar identidade de todos que embarcaram nesse lindo delírio”, inicia para, depois, destacar a biografia da dupla. “Era final dos anos 1990, virada para os 2000. Guardo na memória as noites ouvindo músicas e tocando, sonhando com a ideia de montar uma rádio na internet —naquela época, discada. Compramos uma caixa JBL do Fiskal [terceiro membro do coletivo] e, pela sua crença, percebi que era possível, sim, ser DJ . Assim nasceu o Apavoramento Soundsystem”.
Rubro-negro, João tinha forte ligações com a cultura de baile do Rio de Janeiro. Quem assistia ao programa “Yo! MTV”, em meados dos anos 2000, topou com “Eu Rimo Na Direita/Som Pra Pista”, do coletivo fluminense Quinto Andar, que fez emergir os rappers De Leve e MC Marechal.
“Foram eles [João e o DJ Nepal] que nos convidaram como Quinto Andar para nosso primeiro videoclipe. Era uma época em que era preciso fazer o vídeo num processo bem mais lento que hoje, precisávamos gravar em uma fita de um modelo especial para que pudesse ser passada na MTV. O clipe ficou animal e passou muitas e muitas vezes no canal. Ainda hoje me abordam contando sobre isso”, relembra De Leve. “Foi por causa da Apavoramento que meu repertório de música eletrônica foi aumentando”, acrescenta.
O DJ e produtor João Brasil, dono do hit “Michael Douglas”, destaca que a estética que o xará imprimia nos videoclipes se tornou referência anos depois. “Foi uma das primeiras pessoas que misturavam funk com outras paradas, com outros timbres. Fora o visual que ele fazia… O João sempre foi visionário e influenciou todo mundo. O primeiro disco do Bonde do Rolê [“With Lasers”, de 2007], produzido pelo Diplo, se você for ver, a capa fazia referência às coisas que o João fazia. Ele e a Apavoramento criaram uma estética”, destaca.
Ainda no rap, João produziu o clipe do single “À Procura da Batida Perfeita”, de Marcelo D2, faixa-título do álbum de 2003, referência na música brasileira. Acompanhando a evolução do gênero, João também fez parte dos créditos de “Double Cup”, de Akira Presidente e Bril, single que marcava uma nova fase no rap carioca.
Além do rap, João incursionou com o Apavoramento em clipes de artistas como Rodolfo Abrantes (que, à época, assinava suas produções de hardcore gospel como Rodox) e também da então iniciante no mainstream Ludmilla.
Do primeiro, dirigiu o single “Quem Tem Coragem Não Finge”, que exibia uma face mais surf e calma da banda do ex-Raimundos por meio de intervenções gráficas; da futura estrela pop, dirigiu “Te Ensinei Certin”, aposta do funk pop da agora dona do projeto “Numanice”.
João também foi responsável por momentos icônicos da cultura pop no futebol. É dele a abertura da campanha “Joga Bonito”, da Nike. O slogan virou sinômino de futebol brasileiro ao redor do mundo.
Amigo do produtor, o jornalista Bruno Natal ressalta que João foi uma referência com “uma visão muito peculiar de música e cultura”. É de Marechal o comentário deixado no vídeo com uma saudação à produtora de João: “15 anos atrás… Muita luz a todos amigos do APAVORAMENTO… Seguimos na luta…”. Nepal complementa: Simplesmente amávamos fazer isso juntos, um coletivo de ideias que se entrelaçava entre música e cinema. Você me ensinou tanto sobre cultura, cinema, música, arte e até terror. Trocamos experiências e aprendemos um com o outro. Montamos uma produtora, realizamos shows, sonhos e rodamos o mundo. Minha primeira tour, meu primeiro projeto musical, as festas e os sets nasceram de conversas e planos na sua sala, onde suas ideias sempre desafiavam o comum e se tornavam realidade no nosso futuro”, finalizou o parceiro em homenagem.
O assassinato de João Rebello
De acordo com a Polícia Civil da Bahia, o corpo de João foi encontrado na Praça da Independência, ponto de encontro da pequena Trancoso. O crime está sendo investigado pela delegacia local e ainda não se sabe o motivo e a autoria. Testemunhas contaram que dois homens de moto se aproximaram do automóvel e atacaram. O veículo foi atingido por 12 disparos.
Em vídeos extraídos de câmeras de segurança, João aparece estacionando o veículo quando é surpreendido pelos criminosos. Um deles, armado, atira diversas vezes pela janela do carro; em seguida, a arma é passada ao piloto da moto, que também dispara contra o ex-ator.