Blocos tradicionais do Rio admitem derrota contra ‘novo Carnaval’
Presidente de associação de blocos chamou de 'engessado' modelo tradicional


Os blocos Imprensa Que Eu Gamo —criado há mais de 30 anos— e o Suvaco do Cristo —que completa 40 anos em 2025— estão se despedindo tristemente do Carnaval carioca.
Adeptos de um modelo classificado como “engessado”, esses blocos vêm perdendo espaço e público para blocos de repertório “jovem” e que perambulam em forma de fanfarra pelo Centro da cidade.
Em depoimento para o Tempo Real, a presidente da Associação Independente dos Blocos de Carnaval de Rua (Sebastiana) e fundadora do Imprensa que eu Gamo, Rita Fernandes, adotou uma retórica de traquilidade sobre a saída dos blocos tradicionais da rua.
“As coisas no carnaval se transformam sempre, principalmente no carnaval de rua. Existe a mudança de um ciclo. Ainda tem espaço para alguns blocos que trabalham no modelo de carro de som, mas a gente já vê nitidamente, com o que vem acontecendo nos últimos anos, a mudança de comportamento para um carnaval mais fluído e menos engessado”, disse a presidente.
No dia 4 de janeiro, o prefeito Eduardo Paes compartilhou no Twitter prints em que revela que a gestão não conseguiu entender, até hoje, a dinâmica anárquica dos blocos chamados “piratas” que perambulam sem autorização pela cidade. Pelo tom do post, a Prefeitura deixa claro que não consegue uma solução para os blocos alternativos —e, agora, vê também dois blocos tradicionais dizendo que estão sucumbindo.
“É uma manifestação que fazemos anualmente para lembrar que o carnaval acontece nas ruas do Rio há mais de dois séculos, independentemente de qualquer ação da prefeitura.“
Eu acho curiosa a posição desse pessoal! Como se a prefeitura criasse algum tipo de constrangimento para… pic.twitter.com/8cOUIuo0y2— Eduardo Paes (@eduardopaes) January 4, 2025
71% dos blocos do RJ consideram Carnaval ‘regular, ruim ou péssimo’
Blocos legalizados como Agytoê, Exagerado, Bloco da Terreirada, Empolga às 9, entre outros, se organizaram e publicaram, no início de fevereiro deste ano, por meio do Coreto (Coletivos de Blocos Organizados do Rio de Janeiro), um relatório de carnaval com as opiniões. Ao todo, foram ouvidos quase 40 blocos.
Entre os dados, um número salta aos olhos: 71% dos blocos cariocas avalia a experiência de produção do Carnaval de rua como ‘regular, ruim ou péssima‘. E nenhum deles escolheu a opção “ótimo”.
Ao G1, Pedro Dias, um dos idealizadores do relatório e fundador do bloco Planta na Mente, indagou o poder público. “Por que um bloco como a Terreirada Cearense tem que sofrer tanto para fazer um dos desfiles mais bonitos que essa cidade tem na Quinta da Boa Vista, sem ocupar nenhuma via de trânsito pública? E o Vamo ET, que faz uma apresentação numa praça, por que é tao difícil conseguir uma autorização? São tantos indeferimentos até conseguir uma brecha…Eu mesmo já tive que pagar ambulância 3 anos seguidos no Planta na Mente, sendo que acabamos o desfile colado no Hospital Souza Aguiar. Encarece muito o cortejo”, desabafou.
Os blocos defendem que, se o financiamento não vem pela iniciativa privada em parceria com a Riotur, deveria vir da própria Prefeitura isoladamente ou de patrocinadores em parceria direta com o bloco. Porém, não é o que eles contam que acontece.
Atualmente, o Caderno de Encargos da Prefeitura rege essa parceria público-privada. Ele orienta as empresas privadas que querem apresentar propostas de produção e implementação de infraestrutura de suporte aos desfiles dos blocos de rua para o Carnaval do Rio e, em contrapartida, ganham algumas vantagens como uma gigantesca exposição de marca.
“Sinto que daqui a 30 anos a gente vai estar falando da mesma coisa. Tem que haver uma resolução específica para Carnaval de rua que não coloque megablocos e bloquinhos no mesmo balaio de gato, submetidos à logica de eventos. É preciso que haja uma resolução específica para Carnaval de rua e, para isso, Riotur não pode ser uma adversária e sim uma aliada. Não estou acendendo uma vela para deus e outra para o diabo. Eu sou presidente de um bloco de Carnaval, mas que vira um inferno enquanto não conseguir o aval da Prefeitura”, confessa Vagner Fernandes, fundador do Timoneiros da Viola.