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Armin Van Buuren: “A música eletrônica infectou todos os gêneros musicais”

Armin Van Buuren: “A música eletrônica infectou todos os gêneros musicais”

O DJ holandês Armin Van Buuren no palco do Tomorrowland Brasil em 2024. Divulgação.

Se tem um DJ holandês que já merece tirar seu CPF, esse cara é Armin Van Buuren. Por mais de duas décadas, seu nome vem ajudando a trazer popularidade mundial ao trance, gênero que ele ajudou a consolidar e levar a patamares estratosféricos. À frente da plataforma A State of Trance, que compreende um programa de rádio, um festival global e uma gravadora, além de seu próprio selo, Armada Music, Armin não só ditou tendências, mas foi crucial para a descoberta e o desenvolvimento de inúmeros talentos. O DJ é tão gigante que tem até uma estátua sua em tamanho real no Museu Madame Tusseauds, em Amsterdã.

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Alok (foto: reprodução)

A relação do holandês com o Brasil é longa, profunda e marcada por afeto mútuo. Uma das primeiras grandes estrelas internacionais da cena de DJs a pisar repetidas vezes em solo brasileiro, Armin testemunhou e participou ativamente do crescimento do país como um polo fervilhante da cultura eletrônica. De festivais icônicos como o Skol Beats a templos como a Green Valley, ele construiu uma conexão genuína com o público, que responde com uma energia e paixão que ele mesmo já definiu como únicas no mundo. Essa história de admiração e shows inesquecíveis transformou o Brasil em uma de suas paradas mais especiais e recorrentes.

Durante uma manhã fria de São Paulo, a editora-chefe da Billboard, Claudia Assef, conversou via zoom com o holandês sobre funk, Ayrton Senna, Skol Beats e, claro, a cena eletrônica brasileira, que ele considera uma das mais animadas do mundo.

Armin Van Buuren é um das principais atrações do festival Tomorrowland Brasil, que abre suas portas nesta sexta (10), no Parque Maeda, em Itú, e segue com mais de 100 DJs entre seus palcos até domingo (12). A Billboard Brasil é parceira de mídia do evento e vai trazer todas as informações direto do front para você.

Billboard Brasil – Sou uma grande fã da música eletrônica holandesa. Embora seja um país pequeno em tamanho, é gigante na música. Por que você acha? É a água que vocês bebem ou o quê? Existe uma fórmula secreta que não podem compartilhar com ninguém de fora da Holanda (risos)?

Armin Van Buuren – Se eu te contar, vou ter que te matar ou algo assim (risos). Não, acho que a resposta é muito menos romântica do que você pensaria. Acho que é muito importante entender que a dance music já era muito popular aqui no final dos anos 80, início dos anos 90, sabe? Meus melhores amigos na escola, por exemplo, todos compravam vinil. Eu estava comprando equipamentos. Nós já éramos muito avançados com a música, e não só eu, mas também um organizador de eventos como a ID&T, que basicamente começou a profissionalização da indústria da dance music com eventos como Sensation, Inner City e, mais tarde, eventos como Mysteryland. E a Mysteryland ainda é o evento original da Tomorrowland. A Tomorrowland era o evento irmão mais novo na Bélgica da Mysteryland. Muita gente não sabe disso. Há muita dance music vinda da Alemanha, muita da Bélgica, a capital da dance music é a Inglaterra. Se você olhar o mapa, verá que a Inglaterra está à nossa esquerda, a Alemanha à nossa direita e a Bélgica ao sul. Então, estamos meio que espremidos no meio, sabe? Você provavelmente já viajou da Bélgica para a Holanda, ou da Holanda para a Alemanha. É super perto. Quero dizer, se você entrar no carro, pisar no acelerador, em uma hora, uma hora e meia, você está na Alemanha. E no Brasil, você nem saiu da cidade, né? Então, acho que todos esses países são tão pequenos e todos nos influenciam. Quando eu tinha 15, 16 anos, eu ouvia música eletrônica. Então acho que essa é a resposta para a sua pergunta, espero.

Definitivamente. Quem foram os pioneiros que te atraíram, que você seguia e ouvia no seu país?

Há um cara em particular que gostaria de mencionar, você pode não conhecê-lo, mas o nome dele é Ben Liebrand. Ele era considerado o maior DJ de todos, sabe? Ele é considerado por muitos DJs holandeses o padrinho da música eletrônica. Ele ainda está vivo, é um amigo querido agora. Ele se mudou para a Ilha de Vancouver, no Canadá, mas ainda volta muito à Holanda para fazer shows e ainda é tecnicamente um dos melhores DJs que já vi. E ele foi um dos primeiros a realmente mixar dois discos juntos. Eu sei como isso soa bizarro, porque é o que fazemos agora em nossos iPhones enquanto cozinhamos. Mas ele foi o pioneiro de tudo isso e tinha um programa no rádio, mixando 100 músicas em uma hora, isso em 1983, 1984, quando era tecnicamente quase impossível fazer mixagens daquela forma. Então, ele foi uma inspiração muito, muito grande.

Claro, os primeiros DJs que foram super importantes para mim, eu era um fã de Future Sound of London, The Orb, Sasha, Digweed, Paul Oakenfold. Na Holanda, você tinha Dimitri, Marcelo, Remy, Isis, DJ Jean, Ronald Molendijk. Já havia uma cultura de dance music muito viva no início dos anos 90 e, sim, isso começou tudo o que chamamos de dance music hoje. Então, por exemplo, meu sócio e manager, Michael Piron, que é o co-fundador da [gravadora de Armin] Armada, também… ele tem a mesma idade que eu, ele era DJ em uma boate local e nós éramos apenas entusiastas da dance music. E nós não sabíamos que a dance music ficaria tão grande. Agora está no mundo todo e há esses grandes festivais. Mas quando nos apaixonamos por ela, era apenas uma coisinha. A maior coisa que você poderia alcançar era tocar em uma boate para 800 pessoas.

Mas você acha que eventos como a ADE (Amsterdam Dance Event), por exemplo, que é a maior conferência do mundo, também é uma influência? Porque as pessoas não estão apenas ouvindo, mas estão debatendo, estão pensando…

Claro. A música eletrônica é uma indústria séria aqui na Holanda. Muita gente ganha a vida em muitas áreas diversas que geram renda e movimentam a economia. Muitas pessoas olham para a Holanda para, sabe, entender “qual é a próxima grande novidade”. E em Amsterdã há também uma cena de clubes muito vibrante no momento, lugares que realmente trazem os novos talentos à tona, o que é muito excitante.

Armin Van Buuren
Armin Van Buuren (Divulgação)

Isso é incrível. E você vem ao Brasil há muitos anos, certo? Nem consigo lembrar quando foi a primeira vez, talvez em um festival chamado Skol…

Beats? Em 2004? Qual era o nome da boate mesmo? Eu tive um show em uma boate no Brasil em 2004, esqueci o nome, mas era uma boate super, super popular perto de São Paulo.

Anzu?

Anzu Club, acho que era. E o Skol Beats! Oh, cara! Foi tão incrível!

Qual é uma das suas memórias? Porque naquela época a cena era muito legal, o festival era enorme. Quero dizer, era um festival para umas 50 mil pessoas, se não me engano.

Loucura, era insano. Lembro de descer do avião, ir para o hotel e então chegar ao festival e ver 50 mil pessoas lá… era simplesmente insano. E isso foi por volta de 2006, 2007. Agora eu venho ao Brasil muitas, muitas, muitas, muitas vezes. Umas 30, 40 vezes. Não sei. Perdi a conta. Eu fui a todos os lugares, sabe? Recife, Florianópolis, Green Valley, Laroc, Salvador, Carnaval, Rio. Tudo.

Armin Van Buuren (Divulgação)
Armin Van Buuren (Divulgação)

 Do que você mais gosta no Brasil?

A cultura, o espírito livre. O Brasil é um país tão apaixonado, o espírito latino-americano está realmente em vocês. Se você for tocar na festa certa, eu vivi algumas das minhas festas favoritas no Brasil. Esse povo é louco, cara! Eles festejam até uma da tarde, sabe? Ainda estão firmes. É loucura. E tudo é tão longe no Brasil, mas vale tanto a pena a viagem porque, sabe, uma boate como a Green Valley, eu tento explicar para outras pessoas qual é a mágica. É uma boate tão incrível, uma vibração tão maravilhosa. Ninguém fica parado, ninguém está posando, todo mundo está se divertindo muito. E você não vê isso em muitos outros países. E sim, o Brasil é definitivamente um dos melhores países para festejar. Quero dizer, é por isso que agora há muitos DJs brasileiros populares. Já estava na hora, sabe, de pessoas como Alok, Vintage Culture serem gigantes… O som brasileiro está realmente explodindo em todo o mundo. Até fabricantes de plugins agora vêm do Brasil. Alguns dos plugins que eu uso são do Brasil. É ótimo.

Uma coisa que quero mencionar é, claro, é o funk. Quando você toca, soa como se fosse de outro planeta?

Ele se encaixa na cultura brasileira. Eu entendo totalmente. É um estilo de vida no Brasil, sabe? Eu sei que as letras do funk são geralmente muito, muito sexuais.  Mas acho que é meio que uma brincadeira, entende o que quero dizer? Acho que se você cantasse essas músicas na Holanda… elas são muito explícitas sobre o que querem fazer com as mulheres, as posições e tudo que colocam nessas músicas. Mas é cultural. É parte da cultura brasileira. Eu entendo isso agora. E posso ver a graça. É difícil explicar, mas sim, há tantas músicas de funk que até meus filhos, eles nem sabem, mas às vezes tocam músicas de funk aqui em casa. E eu fico, “ainda bem que eles não falam português”, sabe? Eles não saberiam o que estão dizendo, pois essas letras são pesadas. Nem todas, mas a maioria delas. Não cabe a mim odiar ou amar. Acho muito interessante.

Quero puxar outro assunto amplamente amado pelos brasileiros. Vamos falar um pouco sobre o Ayrton Senna, o projeto com o qual você se envolveu. Você era fã?

Ele é uma lenda. Eu ainda não acredito que eu realmente fiz uma faixa com os vocais dele. É insano.

 Mm-hmm. E você tocou no Brasil, no Tomorrowland. Como foi isso?

Muito especial. Acho que daqui a mil anos as pessoas ainda saberão quem é Senna, sabe? Ele foi um grande orgulho. Todos que vêm do Brasil são tão apaixonados, especialmente quando se trata de futebol ou esportes. Os brasileiros se enchem de orgulho, sempre tem muitas bandeiras do Brasil nos festivais onde eu toco. Acho uma coisa linda.

Armin Van Buuren (Divulgação)
Armin Van Buuren (Divulgação)

É incrível. E vamos falar um pouco sobre a Tomorrowland. Qual é o seu relacionamento com o festival? Sei que você toca desde sempre. E também no Brasil. O que esse festival significa para você?

Eu amo os caras. Eles são bons amigos meus. Lembro-me do Michiel e do Christof (se referindo a Michiel e Christof Beers, os fundadores) desde a época em que faziam festas no Sportpaleis em Antuérpia. Toquei na primeira Tomorrowland em 2005, a primeira edição. E era um festival irmão menor da Mysteryland. Eles não podiam chamar de Mysteryland porque era muito perto da fronteira holandesa. Então eles tiveram que pensar em um nome alternativo. É engraçado como essas coisas acontecem, certo? Ser a irmãzinha ou o irmãozinho da Mysteryland e então se tornar uma das marcas de festival mais respeitadas do mundo. É uma loucura. E eu tiro o chapéu para eles. E não quero levar nenhum crédito por isso, porque esses caras realmente fizeram isso sozinhos e elevaram toda a cultura da dance music para um outro nível com suas produções e sua visão de como a dance music poderia ser. O mais importante a entender é que Michiel e Christof são extremamente apaixonados por dance music e tratam seus convidados como realeza, quase. Sabe, todo visitante que vem ao festival Tomorrowland é realmente, sabe, uma pessoa especial para eles.

Legal. E acho que é mágico mesmo. Então quero falar sobre o presente da música eletrônica, o que está acontecendo. Ela está tomando… quero dizer, é tão grande, tão enorme. Não é mais um nicho. Não é um nicho há pelo menos 10 anos, mas agora é realmente… é obrigatória. Todo mundo ama música eletrônica. Você, como produtor, por que acha que ela atingiu esse volume de popularidade?

Acho que há uma geração inteira de jovens crescendo ouvindo dance music agora. Acho que a dance music infectou todos os gêneros musicais. Sabe, se você ouvir qualquer tipo de música no rádio agora, ela geralmente tem um fundo produzido eletronicamente. E todo mundo aceita isso. Eu estava ouvindo o álbum da Taylor Swift, que é um trabalho incrível, na verdade, mas há muitas baterias eletrônicas naquele álbum, por exemplo, o que era algo que não era feito nos anos 80. Tudo era meio que “cool” e tinha que ser bateria real e tudo mais. Então, acho que a música eletrônica está em todo lugar. Então, se você já ouve música popular, você já ouve batidas eletrônicas e programação eletrônica. E é um passo tão pequeno para a música eletrônica, sabe? Acho que é por isso que todo mundo ouve agora. É a música clássica da era moderna, sabe? Acho que as pessoas estão tão ligadas nisso agora.

Você pode me dar alguns nomes de pessoas que você tem ouvido e que estão levando a um outro nível?

Oh, tantos. Acho que recentemente tenho ouvido muito Leighton Giordani, Argy, Reinier Zonneveld… super incríveis. Tem também Mauro Picotto que está fazendo um comeback, Giuseppe Ottaviani. Há muitas pessoas que eu admiro, David Guetta, Martin Garrix, acabei de fazer um single com ele, um cara tão legal, um produtor e DJ tão incrível, eu realmente o admiro. Fiz um single com o Alok também… algo que me deixa muito orgulhoso, está indo muito bem. Puxa… tantos bons artistas. Talvez esse seja o problema de hoje em dia, sabe? Quando você abre seu Spotify, há tanta música para escolher.

 E uma última pergunta. Como você se prepara quando vai para um país como o Brasil, que é tão longe de casa, você já esteve aqui tantas vezes, tem tantos fãs… Você prepara tipo, “oh, vou tocar esse funk, vou tocar aquele, vou tocar aquela”? Como você molda o seu set?

Eu cometi um erro no passado, vindo ao Brasil e tocando música brasileira. Acho que quando as pessoas contratam o Armin van Buuren, elas querem ouvir a música do Armin van Buuren. Sabe, simples assim. Quero dizer, não, eu não vou tocar funk no meu set. Acho que você pode ouvir funk em todo lugar no Brasil. E eu amo funk, mas não é o meu som. Entende o que quero dizer? Acho que vou tocar meus grandes sucessos e dar às pessoas o meu show, porque é para isso que elas estão pagando, é para isso que elas estão vindo. E eu só tenho um show de uma hora….

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