Na efervescente Soho House de São Paulo, Rob Markus, sócio e agente da gigante global de entretenimento William Morris Endeavor (WME), recebeu a Billboard Brasil para uma hora de entrevista que delineou, com otimismo e clareza estratégica, os planos de expansão da agência no Brasil.
O executivo, que há quase duas décadas constrói pontes entre talentos internacionais e o mercado global, revelou que o país não é apenas mais um território em seu mapa, mas um ecossistema único de criatividade e oportunidade.
A trajetória de Markus com o Brasil é longa e afetiva, remontando a viagens na adolescência e à descoberta de um mercado pulsante de festivais na década de 2000, como o inovador Tim Festival. Foi essa conexão inicial que o levou a desempenhar um papel crucial na chegada de eventos como o Lollapalooza ao continente e a identificar, anos mais tarde, o potencial explosivo de uma então emergente Anitta, impressionando-se com sua determinação feroz e visão global desde o primeiro encontro.
Agora, a WME acelera seus esforços no país com uma estratégia bifocal. De um lado, fortalece a rede de turnês para artistas internacionais em cidades brasileiras além do eixo Rio–São Paulo, trabalho encabeçado pelo agente Cesar Figueiredo, brasileiro radicado nos Estados Unidos e hoje um nome importante de booking na empresa. Do outro, talvez o aspecto mais revelador, está a busca seletiva por artistas brasileiros com potencial para transcender fronteiras, como Vintage Culture, Gloria Groove, Pedro Sampaio e Gustavo Mioto, integrando-os à engrenagem global da agência.
A aposta, no entanto, não é massiva, mas cirúrgica. Markus enfatiza que o sucesso internacional exige mais do que talento: demanda paixão, autenticidade e, sobretudo, o comprometimento do artista em investir tempo e carreira nesse projeto, um desafio em um mercado doméstico tão lucrativo e exigente quanto o brasileiro. A WME se coloca não como controladora, mas como facilitadora, uma parceira estratégica para aqueles que, como Anitta e J Balvin, almejam conquistar o mundo.

Rob, essa história com o Brasil é longa. Nós nos conhecemos há cerca de dez anos e, na época, você foi apresentado à Anitta pelo Pepeu Cury. Como foi esse primeiro encontro, que parece ter sido tão marcante?
Foi realmente marcante. Nós nos conhecemos no Fasano, no Rio, e eu saí daquele encontro pensando: “Meu Deus, eu tenho que trabalhar com essa garota. Ela é incrível”. O que encontrei nela, e isso foi impressionante, é que nunca tinha conhecido alguém tão direcionada e obstinada. Ela sabia exatamente o que queria e o que pretendia fazer. Era extremamente focada.
Ela vinha para os Estados Unidos e, na época, aterrissava, ia imediatamente para uma aula de inglês e depois seguia direto para uma reunião no meu escritório. Era uma disciplina insana. Ela praticamente não conhecia ninguém, e eu fiz de tudo por ela: montei listas de contatos, relações públicas, agências, advogados, tudo. Preparei o terreno inteiro.
Trabalhamos juntos por um tempo e nossa relação evoluiu, mas, naquela época, o Cesar era o agente dela no Brasil. Foi por meio dessas chamadas em grupo que eu o conheci e pensei: “Gosto desse cara, quero trabalhar com ele no futuro”.
E a sua relação com o Brasil começou muito antes da Anitta, não é? Seu pai trabalhava no Banco Mundial. Qual foi a sua primeira impressão do país?
Minha primeira impressão foi quando vim ao Brasil aos 12 anos, então faz muito tempo. Fomos ao Guarujá e, naquela época, lembro que foi incrível. Estudei arquitetura e, claro, fui ver todos os edifícios do Niemeyer.
Toda vez que vinha ao Brasil, pensava: “Este país é uma grande oportunidade”. Sempre encontrei pessoas incríveis, muito inteligentes. A comida era ótima, a música era ótima, as bebidas também. Quando cheguei à William Morris, percebi que havia pouquíssimas pessoas atuando como promotoras. Eu era jovem e sempre pensei que precisávamos encontrar outros promotores, outras pessoas para trabalhar.
Ajudei a criar negócios com gente na Colômbia, no Chile, na Argentina, pessoas jovens e apaixonadas. Hoje, todos esses caras são líderes do mercado. Nós ajudamos a formar muitos deles.
E vocês foram fundamentais para trazer o Lollapalooza para a América Latina, certo?
Sim, nós éramos co-gerentes do Lollapalooza naquela época. Ajudamos a trazê-lo para a América Latina, começando pelo Chile, depois Brasil e Argentina. Também tínhamos um festival na Colômbia, o Estéreo Picnic, então isso acabou se tornando um circuito.
Mas lembro de momentos muito específicos no Brasil. Fiquei muito próximo da Monique Gardenberg, que era fantástica, uma grande líder criativa. Lembro de vir ao Tim Festival com TV On The Radio, Thievery Corporation e Beastie Boys. Foi um festival com curadoria incrível, muito importante.
Há um detalhe curioso: fui ao banheiro do festival, na Marina da Glória, no Rio, e eles tinham colocado sachês de aroma, de alfazema. O cheiro era ótimo. Lembro de pensar: “Esse país tem algo especial, eles pensam nos detalhes”. Isso foi em 2005 ou 2006, muito antes do Lollapalooza. O que a Monique fazia era extremamente relevante; era praticamente a única coisa acontecendo naquele nível.
Isso nos traz ao presente. Qual é a estratégia atual da WME para o Brasil? Quando você diz que está “vindo para o Brasil”, isso significa abrir um escritório físico?
Quando digo que estamos vindo para o Brasil, não significa necessariamente que chegaremos imediatamente com uma grande estrutura física. É uma estratégia parecida com a que usamos no início da música latina.
O Cesar, por exemplo, trabalha no escritório de Miami, mas deve passar talvez 90 dias por ano aqui, ou até mais. O que ele fez foi incrível. Antes, falávamos com cinco ou dez promotores; agora, falamos com cerca de 200. Estamos em contato com pessoas em João Pessoa, Recife, em todos os lugares.
Muitos desses promotores querem trabalhar com artistas internacionais, mas não sabiam com quem falar. Eles conseguiam vender shows de artistas brasileiros, mas não tinham acesso ao catálogo anglo. Agora, têm. O Cesar organizou turnês com artistas como Donovan Frankenreiter, que tocou em dez cidades no Brasil, ou Sojo, que fez 30 datas. Fizemos shows com Esperanza Spalding, quatro apresentações, e até com um comediante, Morgan Jay, que lotou casas falando em inglês. Isso mostra a força e a diversidade do mercado.
E, do outro lado, na representação de artistas brasileiros globalmente, qual é o critério? A música eletrônica parece um caminho mais óbvio por ser universal.
Exato, a eletrônica é mais universal. Mas temos uma estratégia individual para cada artista; não estamos assinando apenas por assinar.
A Gloria Groove, por exemplo. Acho o Daniel incrivelmente talentoso, com uma voz excelente e uma visão muito clara. Além disso, há a plataforma LGBTQIA+. Criamos uma equipe com um agente português gay do nosso escritório de Londres. Ele conhece bem esse ambiente, esse mercado. Ele se apaixonou pela Gloria, e estamos usando essa plataforma como primeiro passo para gerar exposição internacional. Não é o plano completo, mas é uma porta de entrada.
E por que, por exemplo, uma artista fantástica como a Iza não é representada por vocês? O que falta nesse quebra-cabeça?
Eu amo a Iza. Ela é fantástica, e a Rosana, sua manager, é incrível. Poderíamos representá-la, mas a questão é: eu não sei exatamente o que fazer com a Iza no mercado internacional.
O estilo dela é muito próximo ao de ícones globais como Beyoncé e Alicia Keys. Ela não é inferior a elas, mas é difícil encontrar um ângulo realmente único que a diferencie em um mercado global extremamente saturado, ainda mais com a barreira do idioma. A competição é muito acirrada.
Então por que a Anitta deu certo? O que ela tinha de diferente?
Porque existe uma Anitta. Uma super Anitta, intensa, multifacetada. Você olha e pensa: “Isso é uma potência”. Ela tem uma personalidade única e inconfundível.
E, acima de tudo, ela se comprometeu. Tive com ela a mesma conversa que tenho com muitos artistas brasileiros. Disse: “Não faça 200 shows por ano no Brasil. Faça 50. Seu cachê sobe, você ganha o mesmo dinheiro, sua carreira dura mais e você usa o tempo extra para construir sua carreira na América, na Europa”.
Ela se mudou, aprendeu o idioma, trabalhou com produtores. Muitos artistas brasileiros têm medo de perder o mercado doméstico. Estão acostumados a fazer dois, três, quatro shows por fim de semana. A Anitta foi uma das primeiras a tomar essa decisão difícil.
Você acredita que a música brasileira, em português, pode gerar um ídolo global no nível de um Bad Bunny, sem precisar cantar em inglês?
É uma pergunta difícil. O português tem um mercado menor que o espanhol, o que complica. Não sei.
Pode existir um hit global, como “Gasolina” ou como o Michel Teló teve com “Ai Se Eu Te Pego”, mas isso é uma coisa. Construir um artista global, sustentável, cantando majoritariamente em português, é outro desafio.
O fato de J Balvin e Bad Bunny serem artistas globais cantando em espanhol mostra que é possível. Depende da música certa. No caso do Pedro Sampaio, por exemplo, ele é produtor; a base instrumental é fundamental. O funk pode estourar globalmente. Será uma progressão natural.








