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O que acontece com nosso corpo quando ouvimos uma música que nos marcou?

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O que acontece com nosso corpo quando ouvimos uma música que nos marcou?

Corona Luau MTV homenageia Cássia Eller em 2025 (Rafa Leforte)

Magali Otto, 63 anos, lembra como se fosse hoje: “Vi a Cássia Eller no Metrópolis em 1991 cantando ‘Eleanor Rigby’ e me apaixonei”.

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Chico Chico e Nando Reis tocam Cássia Eller no Coala 2025. Reprodução Instagram

Para a assistente financeira de São Paulo, músicas de Cássia são atalhos para lugares da vida: “Malandragem me lembra um tempo bom, quando a gente não tinha tantas preocupações. ‘All Star’ e sua letra maravilhosa sobre amor, amizade e sobre a felicidade de reencontrar alguém especial me levam a uma amiga de 5 décadas que encontro todo dia 3 de dezembro”.

Esse tipo de ligação íntima entre canção e memória explica por que homenagens como o Corona Luau MTV, gravado em Maresias em outubro, que celebra Cássia Eller com Nando Reis, Céu e Os Garotin, tocam tão fundo. 

Magali Otto, fã de Cássia Eller desde 1991 (Arquivo pessoal)
Magali Otto, fã de Cássia Eller desde 1991 (Arquivo pessoal)

Quando uma voz aliada a uma letra entra nessa rede de lembranças, o corpo responde quase que automaticamente: o sistema límbico —a central das emoções— acende, e áreas do cérebro responsáveis pelo prazer começam a trabalhar em coro. 

O neurologista William Rezende do Carmo, chefe de equipe no Hospital Sírio Libanês e fundador da clínica Regenerati, explica: nostalgia é lembrar de alguém ou algo que causou um sentimento bom em uma época. “A música tem a vantagem da repetição. No seu pico, ela é ouvida muitas vezes, o que ajuda na fixação no vínculo emocional”, diz o médico. “Uma pessoa que ouvia muito Nirvana numa fase rebelde, batendo cabeça, quando ouvir depois, vai ter uma nostalgia de energia, de rebeldia. Ou quando ouvia muita MPB contra a ditadura, vai ter uma nostalgia de luta.”

Ouvir uma canção que marcou um encontro, uma festa ou um amor ativa o sistema de recompensa, o mesmo circuito que responde a outras fontes de prazer. O cérebro libera endorfina e serotonina, que traduzem a experiência em sensações físicas: relaxamento, redução do estresse e, às vezes, arrepios ou lágrimas que têm efeito catártico. É comum sentir a respiração mais calma, um sorriso que vem sem pensar ou a pele eletrizando num trecho de guitarra que parecia feito para aquele momento específico da vida.

O neurologista pontua que não só uma música, mas uma coletânea pode ter esse poder de transportar alguém para uma época. “Muitas vezes um conjunto de canções faz esse papel, e aí a viagem ao que te emocionou um dia pode ter 30 minutos, e não três, e isso é fantástico.”

Essa força da memória afetiva aparece também em outras histórias. Isabella Otto, 33 anos, jornalista e filha de Magali, conta que sua relação com Cássia começou junto da relação com a mãe: “Inclusive, no aniversário dela de 60 anos, eu a presenteei com um All Star azul para combinar com o meu preto de cano alto”. 

Para Isa, Cássia permanece atual porque tinha carisma e autenticidade: “Ela não canta; ela sente. É inconfundível. E se mantém viva também no Chico Chico, que inevitavelmente nos lembra dela”. Entre as músicas que mais a emocionam, cita o medley de Abbey Road e, claro, “All Star”, que virou trilha de momentos familiares.

Já Cebola, 49 anos, auxiliar, lembra de ter descoberto Cássia nos anos 2000, quando uma amiga lhe gravou uma fita K7 com “Por Enquanto”. “Eu era office-boy e ouvia todo dia no trem, até gastar pilha. Depois conheci gente que tocava vários sons dela e fui me apaixonando.” 

Para ele, a voz rouca e grave era atitude pura: “Depois da Rita Lee, ela foi nossa porta-voz em cima do palco”. Entre as canções que mais o marcam está “Malandragem”, que ele ouve de olhos fechados lembrando de momentos intimistas. E, como tantos adolescentes dos anos 1990, também guarda “All Star” como símbolo de identidade: “Quem te olhava com um par no pé, surrado, descolado, sujo, rabiscado, já pensava: é roqueiro… Era nossa marca”.

Na turnê que começa dia 30/11 em Brasília e passa por Praia do Rosa (05/12), Rio (14/12) e São Paulo (21/12), quando Nando, Céu e Os Garotin subirem ao palco, não será só som: será a deixa para risos, abraços e histórias que voltam como ondas. Seja na plateia ou assistindo pela Pluto TV, a partir de dezembro, o corpo pode reagir sem aviso — com relaxamento, arrepios, emoção à flor da pele. É essa fusão entre memória afetiva e resposta química que transforma a música em lar emocional.

No fim das contas, ouvir uma canção nostálgica é experimentar uma pequena viagem no tempo que faz bem: reduz estresse, reafirma laços, resgata momentos e, por alguns minutos, deixa a vida mais leve. 

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