‘Até Billie Eilish faz rock progressivo’, diz o roqueiro Steven Wilson
O cantor e multi-instrumentista inglês faz uma única apresentação em São Paulo

O cantor, compositor e multi-instrumentista inglês Steven Wilson é um dos segredos mais bem guardados do showbiz internacional. Embora tenha prestígio junto aos fãs do rock progressivo –gênero que ele defendeu no grupo Porcupine Tree e na carreira solo–, Wilson não é o que poderia se chamar de um nome popular. Mas merece sê-lo e tem condições para isso. As composições dele trazem desde influências de Kate Bush, Peter Gabriel e Pink Floyd e abordam temas como contos de horror (o ótimo “The Raven That Refused to Sing”, de 2013) a questões sociais, políticas e religiosas.
“The Overview”, seu lançamento mais recente, usa a conquista espacial como ponto de partida – o título foi tirado do efeito que a visão do planeta Terra visto da lua causa nos astronautas. Uma suíte de mais de quarenta minutos e dividida em duas partes (os famosos lados A e B do vinil), ela será o ponto de partida da performance do músico em terras brasileiras – ele se apresenta no dia 17 de outubro no Tokio Marine Hall, em São Paulo. O show será acompanhado por projeções de vídeo de Miles Skarin, colaborador de longa data de Wilson.
Em entrevista para a Billboard Brasil, Steven Wilson fala de “Overview”, de como o rock progressivo está nas mais diferentes vertentes musicais e de discos que ajudaram a sua formação musical.
O rock progressivo ainda é popular?
Talvez. Quer dizer, cada um tem sua própria concepção sobre o que seja rock progressivo. Muita gente acha que rock progressivo é só Genesis, Pink Floyd, King Crimson, que foram bastante populares nos anos 1970. Mas ouço progressivo em todos os lugares e em muitos artistas contemporâneos. Billie Eilish, por exemplo, tem esse espírito de rock progressivo, essa curiosidade sobre as possibilidades da música.
Billie Eilish?
Sim, porque essa tem a crença de não seguir a maneira convencional de se fazer música. Por exemplo, temos essa ideia do formato convencional da música pop. Ela existe há 70, 80 anos, desde os tempos de Cole Porter, Rogers & Hammerstein e The Beatles. Todos eles seguiam a convenção de criar músicas baseadas em verso, refrão, verso, refrão, parte do meio, refrão. Billie Eilish não segue essa maneira formal de composição. E é isso que me fascina na música contemporânea: há uma geração inteira de artistas que não se importam com o formato antigo do pop, com esse tipo de conformismo que faz parte do formato da música pop. E para mim, isso era o que o rock progressivo era. Se você voltar ao nascimento do final dos anos 1960, início dos anos 1970, você volta ao nascimento do que hoje consideramos os arquétipos da música progressiva.
Não estou dizendo que Billie Eilish ouve álbuns do Yes e se deixa influenciar pelo Pink Floyd. Mas acho que há uma sensação de libertação das normas, das convenções da música pop.
Hoje em dia ainda existe inovação na música?
Uma das coisas que menos importa em 2025 é essa ideia de fazer música dentro de um gênero. Porque já ouvimos um milhão de bandas de metal. Já ouvimos um milhão de artistas de hip-hop. Já ouvimos um milhão de artistas genéricos de rock progressivo. Já ouvimos um milhão de bandas genéricas de R&B. Já ouvimos um milhão de artistas genéricos de jazz. Acho que o mais interessante sobre 2025 é que vemos muito mais híbridos. Gente combinando jazz com rock. Gente combinando country com batidas de hip-hop. E acho que, à minha maneira, também sou um sintoma disso.
Em relação à sua performance em São Paulo podemos dizer que ela é um curso intensivo de Steven Wilson? Porque ela traz “The Overview”, seu mais recente disco, na íntegra, além de faixas de vários de seus discos.
Sempre digo para o público que não tenho nenhuma música famosa. Eu não tenho nenhum sucesso, sabe, não sou aquele artista que tem dois ou três hits, ou músicas universalmente conhecidas. Eu não… eu não tenho nada assim.
Então, acho que isso é libertador porque posso escolher músicas que sinto que funcionam dentro do show e proporcionam uma experiência única. Então, o repertório foi escolhido de uma forma bastante autoindulgente, exatamente o que eu senti que queria tocar e, obviamente, focado nos últimos discos. Mas eu simplesmente dei uma olhada no meu repertório e escolhi algumas coisas. Uma verdadeira jornada ao longo dos meus 30 anos fazendo música.
Seus discos são diferentes entre si, o que acho particularmente intrigante. Esse seu conceito de música bem construída…
Uma das coisas que me deixam mais orgulhosos na minha carreira é que cada álbum é tem uma personalidade diferente. Então, fiz álbuns que são quase pop puro – e “Future Bites” (2021) é como art pop. Fiz álbuns que são mais como música alternativa, como “Insurgentes”(2008) . Fiz álbuns que são mais como rock progressivo tradicional dos anos 70, como “The Raven That Refused to Sing”(2017).
Quando você escuta “The Overview” você escuta ambient music, música eletrônica, riffs de metal, pop, momentos de puro rock progressivo old school, space rock, rock arena… Tudo meio misturado de uma forma que eu não estou realmente pensando enquanto estou fazendo. Estou apenas deixando fluir naturalmente. Há também a ideia de estruturar um álbum da mesma forma que um filme, um cineasta faria um filme com uma espécie de narrativa e uma sensação de fluidez. Eu sempre adorei isso. Sabe, em todos os meus álbuns, me senti muito, muito atraído pela ideia de que eles tivessem uma espécie de conceito ou narrativa central.
“The Overview” chega acompanhado de um vídeo de Miles Skarin, feito especialmente para esse projeto. Poderia explicar sobre ele?
Surgiu quando percebi que que estava fazendo um álbum sem singles. Não existe essa ou aquela música: é só uma longa peça de 42 minutos de música contínua. Então, é, então a ideia de fazer um tipo de vídeo para promover o álbum meio que não fazia sentido para mim, sabe? E normalmente, se eu fizesse um álbum, eu encomendaria dois ou três vídeos para serem, sabe, uma espécie de singles do álbum, coisas que lançaríamos online para promover o álbum. E, claro, isso não fazia sentido com “The Overview”. O que eu fiz foi pegar todo o dinheiro que normalmente gastaria fazendo talvez dois ou três vídeos diferentes com diretores diferentes e pensei: “vamos encomendar um filme que vá do começo ao fim e acompanhe toda a peça musical do começo ao fim”. E isso tem sido fantástico para as pessoas que vêm aos shows, porque elas estão tendo não apenas uma experiência musical, mas também algo visual, algo cinematográfico que ainda não viram. Sabe, elas ainda não viram no YouTube. É completamente novo. Bem, tirando alguns trechos que divulgamos online.
Os principais nomes do rock amam a ideia de ter um disco remixado por Steven Wilson. Por outro lado, você tem o seu trabalho. Como equilibra essas funções? O que você escuta ou faz acabam influenciando os teus remixes?
Bem, eu já era influenciado por eles. Por exemplo, ano passado fiz o remix de “Pink Floyd at Pompeii’, minha banda favorita de todos os tempos. Sou influenciado por eles desde os 10 anos de idade, sabe. Então, não há nada de novo para mim nesse sentido em me absorver no mundo da música do Pink Floyd. O mesmo vale para qualquer coisa, sabe, todos os álbuns que mixei, seja Van Morrison ou Tears for Fears. São todos artistas que eu cresci ouvindo. Então, acho que já os tenho no meu DNA musical, se isso faz sentido.
Mas acho que a resposta à sua pergunta é que a única coisa que meu trabalho, meu trabalho de fazer discos e meu trabalho de mixagem têm em comum é que eu amo coisas que sejam sonoramente bonitas. Então, para poder mixar um disco antigo produzido por Trevor Horn dos anos 1980. Acabei de fazer “Welcome to the Pleasure Dome”, do Frankie Goes to Hollywood.
Frankie Goes to Hollywood?
Sou fã do trabalho de Trevor Horn, produtor desse disco. Ele foi um dos caras que me interessou em ser produtor e em criar discos com excelente qualidade sonora. E acho que levei isso para todos os meus discos e nos remixes que faço de trabalhos de outros artistas. Trevor foi um dos caras que me fez querer ser produtor e criar discos com qualidade cinematográfica e sonora excelente. E acho que levei isso para todos os meus próprios discos, e também para o meu trabalho de remixagem desses discos antigos, sejam os discos do Trevor ou dos anos19 70. Mas você me perguntou se eu aprendo alguma coisa ou se sou influenciado… Eu aprendo muito sobre como eles fizeram esses discos. Ao conseguir desconstruir e reconstruir esses álbuns incríveis, estou aprendendo o tempo todo. Então, é um presente poder fazer isso.
Trevor Horn foi o vocalista de “Drama” (1980) , um dos meus discos favoritos do Yes. Você gosta desse trabalho?
Para mim está entre os três melhores discos do Yes. Eu adoraria fazer um remix desse álbum, mas as fitas originais se perderam. É o mesmo motivo pelo qual não foi um remix de “Going for the One”, outro grande disco do Yes.
STEVEN WILSON
Quando: 17 de outubro
Onde: Tokio Marine Hall (São Paulo)
Onde comprar: Ticketmaster