Brisando em orquestrações, drumless e na ‘lili’, Marabu lança novo EP
Do Jardim Ângela, ZS de SP, MC explora novos cantos para se libertar
“O detalhe é que nós consegue fazer sem samplear”, diz Marabu sobre as cinco faixas de “LILI”, primeiro EP desde o robusto “FUNDAMENTO”, de 2021, e “DIMALOKA, Vol. 1: Denso”, de 2023. Cantando muitas vezes em bases sem a bateria e beats como principais elementos, lançamento reforça a tática de, sem ser patrão nem funcionário das regras da música pop, “multiplicar ideias de maloka”.
Oriundo do Jardim Ângela, zona sul de São Paulo, Matheus Santos despontou junto com o time da Nebulosa Selo em movimentos que começam no álbum “CÉLULAS”, de 2020, do produtor, compositor e arranjador Levi Keniata.”LILI” destaca a evolução da pesquisa do rapper que, historiador, destina-se a olhar o mundo pela lente do funk —o que, por si só, já é um marcador da direção escolhida e assumida desde “FUNDAMENTO”.
“Eu me debruço há alguns anos pra entender qual a brisa técnica do cantar funk. Já entendi que a minha voz é uma voz de cantar funk – e eu preparei a minha voz pra isso. Meu estudo é o [MC Neguinho do] Kaxeta, o Daleste, o Boladão, o Kauan, Kevin, Ig, MC Rita, a Tati [Quebra Barraco], Deize Tigrona. Uma ambição minha é de ser um artista que ajuda as pessoas a olharem pro funk como arte”, disse em entrevista à repórter Brenda Vidal, na Monkeybuzz, à época de “DIMALOKA”.
Em conversa informal pelo WhatsApp, ele comentou que, em “LILI”, a busca estava sendo aproveitar os estudos de orquestração de Keniata e as inspirações do “drumless”, subgênero do rap que, há algum tempo, faz a cabeça de produtores e rappers (Roc Marciano, Westside Gunn, lá fora; Lessa Gustavo, Killa e Barba Negra aqui dentro) por meio de loops e samples que vão rodando a faixa sem que a bateria seja protagonista —e, mais ainda, sem que seja uma parede, deixando que a harmonia e as texturas permitam uma liberdade maior para a voz. Não à toa, “LILI”.
“Olha o MC que está sem conteúdo / o mercado te ama / arrombado!”, diz com voz rocando da garganta em “cantando pra Lili” —para, depois, esperto, mencionar “Marolento”, hit de Puterrier.
“Costumo dizer que ter aprendido a cantar de verdade com o funk garante essa fita. Tem que ritimar, tá ligado?”. Mesmo com as melodias. Só que, tradicionalmente, os MC do funk mexe com as melodias nas regiões mais agudas —e melodias mais pra cima, escalas maiores. Eu tô procurando manter essa fita mesmo nas regiões graves, nas escalas menores”, explica.
Capa traz dançarina que, em 2018, foi condenada sem provas
A capa que ilustra “LILI” traz Marabu por detrás dos movimentos da dançarina Babiy Querino —modelo, dançarina e bailarina que, em 2018, foi condenada injustamente a cinco anos e quatro meses de prisão pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) por um assalto à mão armada que teria acontecido em 10 de setembro de 2017. À época, em vão, colegas de trabalho que estavam trabalhando com a jovem no dia apelaram em sua defesa
“Assim que a gente entendeu que a liberdade seria representada por uma mulher negra, vimos que queríamos alguém que fosse da performance, do entendimento de terreiro. E, além disso, ela literalmente lutou pela própria liberdade. E ela já falou muito disso, do processo longo do encarceramento, saída, recuperação, restabelecimento espiritual. Sempre admirei muito o corre dela”, diz Marabu, que diz ter se inspirado “naquelas que nos guiam” e considera “LILI”uma homenagem à “malokeragem pensante e consciente”.
Em Agosto de 2019 esse foi meu humilde presente a todos que lutaram junto com a campanha TODOS PELA LIBERDADE DE BABIY QUERINO. Mês que vem completo um ano de liberdade e ando bem reflexiva. No dia deste vídeo eu estava acabada, me sentindo feia e sem esperança de algum retorno. pic.twitter.com/8NO6NqrxU1
— Nega Poucas 🥱 (@_queenrino) August 17, 2020