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Dez anos sem Lemmy Kilmister, a tradução mais perfeita do rock’n’roll

Dez anos sem Lemmy Kilmister, a tradução mais perfeita do rock’n’roll

O baixista, vocalista e líder do Motorhead é objeto de adoração até hoje

  Em “Lemmy” (2010), documentário sobre o baixista, vocalista e líder do Motorhead, um fã mais exaltado disse que só dois seres escapariam vivos de uma provável hecatombe nuclear. “As baratas e Lemmy”, diz ele, turbinado por umas pints de cerveja além do permitido. Infelizmente, a previsão se mostrou mais otimista do que realista. Ian Fraser Kilmister, o Lemmy, morreu no dia 28 de dezembro de 2015, dez anos após ter completado 70 anos.

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Passada uma década de sua morte, poucos astros do rock, pesado ou não, se equiparam em importância à esse senhor, nascido no condado de Stoke-upon-Trent (conterrâneo do astro pop Robbie Williams e do guitarrista Slash), no dia 24 de dezembro de 1945. As tiradas do baixista sobre política e sobre o porquê dos adolescentes idolatrarem o rock pesado se tornaram memes e o Motorhead, que criou em 1975, deu a régua e o compasso para o que seria o rock pesado nos anos seguintes –Metallica, Slayer e até Foo Fighters são devotos.

Lemmy Kilmister encantou-se com o rock’n’roll, como boa parte dos adolescentes do pós-guerra. Teve a oportunidade de assistir a shows dos Beatles e dos Rolling Stones, que então davam seus primeiros  passos no showbiz. “Naquele tempo, os Beatles eram os malvados e os Stones, os filhinhos de mamãe”, lembra na autobiografia “A Febre da Linha Branca”, disponível no Brasil pela editora Belas Letras. Lemmy testemunhou momentos de fúria de John Lennon: viu o beatle descer do palco para esmurrar um espectador que o chamara de gay.  Ajudante de palco de Hendrix, Lemmy lembra com carinho da generosidade do legendário guitarrista – generosidade, aliás, que não era só musical: “Jimi fazia sucesso entre as mulheres. Era capaz de agradar a cinco fãs numa única noite. E sempre sobrava uma para sair conosco.”

A grande criação do baixista foi o Motörhead, cuja formação clássica era constituída por Lemmy, pelo baterista Philthy Animal Taylor e pelo guitarrista Fast Eddie Clarke. Surgido em 1975 sob vaias quase unânimes da crítica especializada, o trio mudou o panorama do heavy metal ao combinar o som alto e pesado com a rapidez e a agressividade do punk rock – o que o transformou em objeto de adoração por ambas as tribos. Uma das lendas em torno do Motörhead é a de que Lemmy teria mandado um dos guitarristas embora (nada menos que Brian Robertson, da lenda do hard rock Thin Lizzy, que substituiu Eddie Clarke em 1982) porque ele insistia em se apresentar de calçãozinho curto –o que destoava do visual de couro do grupo. Lemmy desmente: “Não tenho nada contra shorts. O problema é que ele bebia demais, até para os padrões do Motorhead”. Olha que o grupo era famoso por adotar, com intensidade, o estilo “rock’n’roll” de viver. 

As verrugas monstruosas e o bigodão de bandido de faroeste de Lemmy escondiam um sujeito pacífico. “Quando eu o chamei para um projeto de rock pesado, pensei que ele chegaria num carro com formato de caixão. Mas Lemmy é tranquilo”, lembra Dave Grohl numa entrevista dada a esse jornalista. Lemmy é assíduo em todos os compromissos de sua banda. Admitia o uso de drogas, mas não fazia apologia delas: “Não sou exemplo para ninguém”, diz. “Ele adora uísque e Coca-Cola. Mas nunca bebe até cair”, diz o diretor Wes Orshoski, que passou três anos na estrada com o Motörhead durante as filmagens do documentário “Lemmy”.

O Motörhead marcou presença na trilha de games como o “Guitar Hero”, popular entre a garotada que nasceu quando Lemmy já contava mais de três décadas de carreira. O roqueiro também atua no jogo “Brutal Legend”, ao lado de Ozzy Osbourne (parceiro nas canções “Mr. Tinkertrain” e na balada “Mama I’m Coming Home”) e do ator Jack Black. “Nem sei como era o jogo, apenas coloquei minha voz”, diz. Quando se apresentou no país pela última vez, em março de 2015 (quer dizer, ele nem chegou a entrar no palco, foi posto fora de combate por causa de uma intoxicação alimentar), ele passava por sérios problemas de saúde, que vieram por matá-lo em 2015. Mas foi rock’n’roll até depois de sua morte: cremado, exigiu que suas cinzas fossem colocadas dentro de projéteis de bala, distribuídas para os amigos mais chegados. Jamais nascerá um roqueiro tão raiz quanto Lemmy.

 

 

DISCOGRAFIA SELECIONADA

Sam Gopal – “Escalator” (1969)

O grupo inglês fazia rock psicodélico, costurado por releituras de astros do blues (Willie Dixon, de quem gravaram “Back Door Man”) e do folk (Donovan, presente em “Season of the Witch”). Lemmy assina como Ian Willis e emplaca nada menos do que cinco canções.

Hawkwind – “Space Ritual” (1973)

Embora tenha deixado de fora o hit “Silver Machine”, esse disco ao vivo traz muito do conceito do grupo –que era famoso por unir rock pesado a uma sonoridade, digamos, viajante. Um festival de faixas longas e pesadas.

Motorhead – “Overkill” (1979)/ “Bomber” (1979)/ “Ace of Spades” (1980)

Três discos que praticamente redesenharam a história do heavy metal. Do bumbo duplo do baterista Philthy Animal Taylor em “Overkill” à velocidade e agressividade de “Ace of Spades”, tudo que foi feito aqui acabou sendo aproveitado pelas gerações posteriores –entre elas, integrantes do Slayer e do Metallica, que rejuvenesceram o gênero na segunda metade dos anos 1980. 

 

Motorhead – “Another Perfect Day” (1983)

Único disco do grupo com Brian Robertson, que substituiu Fast Eddie Clarke em 1982 e tinha uma pegada mais para o blues/rock. É o meu predileto, principalmente por causa do riff de abertura de “Back at the Funny Farm” e da ferocidade de “Die You Bastard”.

Motorhead – “Sacrifice” (1995)

O último disco realmente sensacional do grupo. Brian Robertson foi substituído pelos guitarristas Phil Campbell e Wurzell e Animal Taylor deu lugar a Mikkey Dee. As canções trazem uma grande influência do thrash e do speed metal, que eram os gêneros mais populares daquele período. 

 

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