Por que está mais do que na hora de redescobrirmos Kiko Zambianchi
Cantor e compositor paulistana é o autor original de 'Primeiros Erros'
Lançado no dia 25 de maio de 2000, ou seja, há um quarto de século, “Acústico MTV” foi o projeto que fez com que o Capital Inicial, então uma banda de sucesso médio no showbiz nacional, em artistas do primeiro escalão. Foram mais de dois milhões de CDs e DVDs vendidos (dependendo da idade de quem está lendo esse artigo vale a pena perguntar aos seus pais ou avós o que são CDs e DVDs) e deram luz a um repertório de qualidade que tinha passado batido nos anos 1980 e 1990. O curioso é que um dos principais hits daquele projeto, embora tenha nascido nesse período, não havia sido gravado pelo grupo brasiliense. Trata-se de “Primeiros Erros (Chove)”, do compositor e cantor paulista Kiko Zambianchi – que, inclusive, participa do número musical.
O sucesso de “Primeiros Erros” foi tão estrondoso que praticamente se tornou um dos cavalos de batalha do Capital. “Lembro que no ano seguinte ao lançamento do ‘Acústico’ nós tocamos no Rock in Rio e vi aquela multidão cantar com a gente”, disse o vocalista Dinho Ouro Preto numa entrevista ao podcast Desculpincomodar. Aliás, existe até uma parcela do público que acredita que a canção seja da lavra dos roqueiros. Mas o autor do hit, claro, bota fé no seu taco. “Não acredito que muitas pessoas pensem nisso, ela tocou demais quando foi lançada em 1985”, diz Zambianchi à Billboard Brasil.
Incontestável, no entanto, é o talento desse autor e cantor nascido em Ribeirão Preto, cidade situada a 319 quilômetros de distância da capital (Ribeirão que, aliás, decretou que 14 de outubro, data de nascimento de Kiko, fosse transformada em Dia do Rock). Francisco José Zambianchi, 65 anos –e que aparenta bem menos, diga-se– se enveredou pelo mundo da música ainda na adolescência. Durante esse período de batalha, montou uma banda de rock –a Vida de Rua– e fazia contatos com os grandes nomes da MPB que vez ou outra pousavam na cidade. Com Gilberto Gil, por exemplo, chegou a fazer uma pequena jam de violão. Caetano Veloso, por outro lado, o convidou por engano para assistir a um de seus shows. “Eu estava no hotel em que ele se hospedou e uma pessoa da equipe dele perguntou quem eu era. Disse que era o Kiko e ela me confundiu com um amigo do Caetano”, diverte-se. E, sim, a apresentação do baiano tropicalista foi sensacional.
Kiko Zambianchi mudou-se para São Paulo no início dos anos 1980, quando foi contratado pela gravadora EMI. Ali, lançou o compacto “Rolam as Pedras”, de relativo sucesso comercial. O estouro, no entanto, se deu mesmo com “Primeiros Erros (Chove)”, canção criada num período de pânico do artista. “Escrevi quando cheguei a São Paulo e estava me sentindo bastante sozinho. Sofria de síndrome do pânico, algo sobre o qual as pessoas não tinham muito conhecimento naquele período. Os médicos mediam minha pressão e diziam que eu não tinha nada, as pessoas achavam que era uma questão espiritual. Então, começaram a vir ideias nesse contexto para a letra”, disse ele numa entrevista. “Mas não teve uma razão específica por trás dessa música. É sobre contemplar o passado, sei lá! Eu acredito que a gente faz música, mas a música também vem para a gente às vezes.”
“Primeiros Erros (Chove)” tem mais de cem gravações –até Simony, ex-Balão Mágico, a registrou (não conhece? Mais uma vez, pergunte para os seus pais e seus avós) e deu a Kiko o pontapé que ele precisava para a sua carreira –tornando-se, inclusive, um compositor requisitado. Erasmo Carlos (1941-2022), o Tremendão, gravou “Manchas e Intrigas”. Marina Lima, por seu turno, tomou para o seu repertório a deliciosa balada pop “Eu te Amo Você”. Ritchie gravou, em 1987, a bela “Forças de Dentro”.
No mesmo período de ascensão como cantor e autor, Kiko Zambianchi se aproximou de seu primeiro produto made in Brasília. No caso, a Legião Urbana, que tentava também seu lugar ao sol na mesma gravadora do vocalista. “A gente chegou a fazer algumas apresentações juntos, eu cantava ‘Será’, da Legião Urbana no shows…”, recorda-se (nota do redator: uma das performances aconteceu no Caiçara Music Hall, lendária casa de shows de Santos e foi presenciada por esse que vos escreve).
O sucesso de “Choque”, seu disco de estreia, de 1985, foi sucedido por “Quadro Vivo” (1987), onde flertou com a soul music daquele período, e por “Era das Flores”, que trazia uma versão em português de “Hey Jude”, dos Beatles. E por mais que tenha passado um período longe dos holofotes, Kiko nunca deixou de fazer shows e produzir canções. Ele tem, inclusive, trilhas sonoras para peças de teatro –entre elas “As Priscilas de Elvis”, de Ana Ferreira, e “Da Boca pra Fora”, de Marcelo Rubens Paiva– e em 2012 soltou um “Acústico ao Vivo”, no qual recapitula boa parte de seus hits.
O mais recente projeto de Kiko Zambianchi é deveras ambicioso. Ele se uniu ao guitarrista Paul Pesco (que tem no currículo nada menos que parcerias artísticas com Madonna e com a dupla pop americana Hall & Oates) no projeto Jupiter’s NeighBors. Uma combinação de música e atitude social –a ideia é arrecadar fundos para a luta contra o câncer–, ele traz em sua escalação algumas das principais figuras do pop e do rock dos últimos tempos. Estão ali Corey Glover, do grupo de rock Living Colour, o baterista Omar Hakim (Madonna, Sting, Weather Report e muito mais) e a tecladista Rachel Z (ex-Peter Gabriel). A primeira performance desse supergrupo aconteceu em novembro do ano passado na Audio, casa de espetáculos de São Paulo. “Mas a idéia é ganhar um alcance ainda mais internacional com esse projeto”, diz Kiko.
Atualmente, Kiko se divide em apresentações solo e às últimas performances acústicas do Capital Inicial. Mas certamente deve preparar um novo material para 2026. Que seja o ano em que Kiko retome a aclamação popular.








